ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO AFASTADA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE PRIVATIVA DE ADMINISTRADOR. DESEQUIPARAÇÃO DE DUPLO REGISTRO EM CONSELHOS PROFISSIONAIS.

RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (Relator)
:Trata-se de agravo interno interposto contra decisão assim ementada (fl.
346):

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO AGRAVADA. FUNDAMENTO. AUSÊNCIA DE
IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. AGRAVO NÃO CONHECIDO.
A parte agravante sustenta que, nas razões de seu agravo em recurso especial, teria realizado a impugnação específica de todos os
fundamentos da decisão que não admitiu o processamento do Recurso Especial, inclusive sobre a aplicação da Súmula 7/STJ, o que imporia a reversão da decisão anterior.
Com impugnação.
É o relatório.


VOTO
O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (Relator)
: Consigne-se inicialmente que o recurso foi interposto contra decisão publicada na vigência do Código de Processo Civil de 2015, devendo ser
exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele previsto, conforme Enunciado Administrativo n. 3/2016/STJ.
A decisão ora agravada não conheceu do agravo em recurso especial, uma vez que não impugnado, especificamente, o fundamento da decisão que inadmitiu o recurso na Corte de origem.
Neste agravo interno, a parte recorrente não demonstrou ter se insurgido, na minuta do agravo, contra a decisão que obstou o recurso especial e que está respaldada na aplicação da Súmula 7/STJ.
À parte agravante impõe-se o ônus de observar o contexto em que os fundamentos da decisão da Corte de origem foram lançados e impugná-los, de forma individualizada e específica, o que não ocorreu no caso dos autos.
Para afastar a aplicação da Súmula 7/STJ, não basta a mera afirmação de não cabimento desse óbice sumular, devendo a parte apresentar argumentos suficientes a fim de demonstrar que, para o STJ mudar o entendimento da instância de origem sobre a questão suscitada, não é necessário reexame de fatos e provas da demanda.
Assim, a falta ou a insurgência genérica contra a decisão que não admitiu o recurso especial, no tempo e modo oportunos, obsta o conhecimento do agravo. Essa é a determinação contida nos artigos 932, III, do CPC/2015 e 253, parágrafo único, I, do RI/STJ (Redação dada pela Emenda Regimental n. 22, de 2016).
Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.
É como voto.

[…]

(STJ- AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2723990 – RS, RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES, JULGADO EM: 10/12/2024)

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RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária ajuizada por NEBRASKA CAPITAL GESTAO DE RECURSOS LTDA objetivando a declaração de inexigibilidade da multa aplicada, bem como a desnecessidade de inscrição junto ao CRA/RS.

O magistrado de origem julgou improcedente o feito, nos seguintes termos (evento 35, SENT1):

“3. DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido, com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios aos procuradores da parte ré, os quais, atendendo ao disposto no art. 85, §§ 2° e 8°, do CPC, fixo em R$3.000,00 (três mil reais), atualizados a partir desta data com base no IPCA-E e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a contar do trânsito em julgado da presente sentença. 

Sentença não sujeita à remessa necessária.

Interposto recurso, intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para contrarrazões, nos termos do artigo 1.010, § 1º, do CPC. Juntada(s) as respectivas contrarrazões e não havendo sido suscitadas as questões referidas no §1º do artigo 1.009 do CPC, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Caso suscitada alguma das questões referidas no §1º do artigo 1.009 do CPC, intime-se o recorrente para manifestar-se no prazo previsto no §2º do mesmo dispositivo.

Com o trânsito em julgado na forma em que prolatada esta sentença, proceda-se ao levantamento do depósito judicial em favor do CRA/RS.

Publicação e registro eletrônicos. Intimem-se.”

Apela o autor (evento 59, APELAÇÃO1). Sustenta, preliminarmente, que a sentença atacada deixou de fundamentar as razões e provas consubstanciadas no feito para a demonstração de que as penalidades relativas aos processos administrativos eram válidas e dentro dos parâmetros basilares para aplicação da multa, a teor do art. 489, § 1º, IV, do CPC, pelo que é ausente de fundamentação. No tocante ao mérito, argui que a Lei n.º 6.839/80 estabelece que é obrigatório o registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros, e, diante disso, não é possível considerar atividades secundárias, ainda que constantes no contrato social da empresa, como a atividade-básica. Nesse sentido, entende ser totalmente inconcebível o enquadramento da empresa como atuante em atividades inerentes à administração, ao passo que é uma gestora de recursos independente, vinculada, por certo, ao órgão que tenha o poder de fiscalizar quem utiliza de valores para investimentos, sendo autorizada a operar pela Comissão de Valores Imobiliários – CVM, uma vez que sua atividade principal é a de assessoramento de terceiros para alocação de valores em fundos de investimentos e demais atividades específicas no mercado de capitais. Portanto, requer, caso não seja acolhida a preliminar, a reforma da sentença a fim de que a ação seja julgada totalmente procedente.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte (evento 63, CONTRAZ1). 

É o relatório.

VOTO

A controvérsia dos autos diz respeito à possibilidade de declarar a inexigibilidade da multa aplicada, bem como a desnecessidade de inscrição junto ao CRA/RS.

Consta da sentença a seguinte fundamentação:

(…)

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. Mérito

A Lei nº 4.769/65, que dispõe sobre o exercício da profissão de Técnico de Administração, categoria profissional cuja denominação foi alterada para Administrador pela Lei nº 7.321/85, prevê:

Art 2º A atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, VETADO, mediante:

a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;

b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos da administração VETADO, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que esses se desdobrem ou aos quais sejam conexos;

Ainda, o art. 3º do Decreto nº 61.934/67 assim dispõe: 

Art 3º A atividade profissional do Técnico de Administração, como profissão, liberal ou não, compreende:

a) elaboração de pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens e laudos, em que se exija a aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de organização;

b) pesquisas, estudos, análises, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos de administração geral, como administração e seleção de pessoal, organização, análise métodos e programas de trabalho, orçamento, administração de matéria e financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais bem como outros campos em que estes se desdobrem ou com os quais sejam conexos;

c) o exercício de funções e cargos de Técnicos de Administração do Serviço Público Federal, Estadual, Municipal, autárquico, Sociedades de Economia Mista, empresas estatais, paraestatais e privadas, em que fique expresso e declarado o título do cargo abrangido;

d) o exercício de funções de chefia ou direção, intermediaria ou superior assessoramento e consultoria em órgãos, ou seus compartimentos, de Administração Pública ou de entidades privadas, cujas atribuições envolvam principalmente, aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de administração;

e) o magistério em matéria técnicas do campo da administração e organização.

Parágrafo único. A aplicação do disposto nas alíneas c , d , e e não prejudicará a situação dos atuais ocupantes de cargos, funções e empregos, inclusive de direção, chefia, assessoramento e consultoria no Serviço Público e nas entidades privadas, enquanto os exercerem.

Convém pontuar que o desempenho de algumas das atribuições genéricas contidas no art. 2º da Lei nº 4.769/65 não torna, por si só, obrigatória a inscrição junto ao CRA, uma vez que a profissão de administrador somente se caracteriza pelo exercício profissional da atividade de administração, em que se exige o domínio de conhecimentos e habilidades específicas.

Esse é o entendimento consolidado do TRF da 4ª Região sobre o assunto:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE PRIVATIVA DE ADMINISTRADOR. INOCORRÊNCIA. 1. O fato da parte autora desempenhar algumas das atribuições genéricas contidas no art. 2º da Lei nº 4.769/65 não torna, por si só, obrigatória a inscrição junto ao CRA, uma vez que a profissão de administrador somente se caracteriza pelo exercício profissional da atividade de administração, em que se exige o domínio de conhecimentos e habilidades específicas, o que não é o caso dos autos. 2. Se as atividades exercidas pelo autor não estão abrangidos pela área de atuação do profissional de administração, nos termos da Lei 4.769/65, porquanto não pratica atos privativos de administradores, deve ser reconhecida a irregularidade do ato que indeferiu o pedido de cancelamento de registro formulado pelo demandante. (TRF4 5031436-59.2018.4.04.7000, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D’AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 31/01/2019)

Oportuno registrar, ainda, que a atividade relacionada ao atendimento de clientes não é exclusiva de administrador. Cito, por todos, precedentes recentes nesse sentido, um da Segunda e outro da Terceira Turma da Corte Regional:

TRIBUTÁRIO. CONSELHO PROFISSIONAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. APELAÇÃO. DESERÇÃO AFASTADA. FATO GERADOR. EXERCÍCIO DA PROFISSÃO. AFASTAMENTO. INEXIGIBILIDADE DE ANUIDADES. PEDIDO DE CANCELAMENTO. EXISTÊNCIA. 1. O preparo da apelação compreende o recolhimento de custas e porte de remessa e retorno. Em se tratando de apelação interposta em sede de embargos à execução fiscal processados na Justiça Federal, é preciso considerar que esta possui regime de custas próprio consolidado por meio da Lei 9.289/96, o qual dispõe em seu art. 7° que “a reconvenção e os embargos à execução não se sujeitam ao pagamento de custas”. Assim, correto afirmar-se que, o preparo das apelações interpostas em embargos à execução fiscal processados na Justiça Federal, está isento de custas. 2. No que se refere ao porte de remessa e retorno, o art. 47 da resolução nº 17/2010, deste TRF, prevê a dispensa do recolhimento para os recursos interpostos no E-proc. 3. No caso dos autos verifica-se que as anuidades cobradas referem-se aos anos de 2012 a 2015, predominando anuidades em que se considera o fato gerador da obrigação a inscrição regular nos quadros do Conselho (2013 a 2015). 4. Houve pedido de cancelamento em período anterior às anuidades cobradas, que foi afastado pelo Conselho sob o fundamento de que a atividade exercida é típica da Administração. 5. Hipótese em se fez necessária a análise efetiva da atividade da embargante junto ao seu empregador. No caso em tela, tem-se a comprovação de que a embargante exerce a função de analista de marketing, conforme declaração da empresa onde labora, contendo as atividades por ele exercidas. Em conclusão vê-se que não há a prática da atividade privativa de Administrador. 6. O fato da apelado desenvolver algumas das atividades referidas na legislação que rege o exercício da profissão de administrador, não significa que tais atividades devam ser exercidas unicamente por administradores. – Atividades relacionadas à área de atendimento a clientes, gerente de vendas, financeiro e de recursos humanos e analista de marketing não são exclusivas de administradores. 7. Superada a questão do exercício da atividade fiscalizada e diante do pedido de cancelamento do registro da embargante junto ao Conselho, resta claro seu desinteresse em manter-se vinculada a esse Órgão, apesar do ônus de não mais exercer livremente as atividades relacionadas. Sentença mantida. (TRF4, AC 5010683-85.2017.4.04.7107, SEGUNDA TURMA, Relator ANDREI PITTEN VELLOSO, juntado aos autos em 27/09/2018, destacado)

REMESSA OFICIAL. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE PRIVATIVA DE ADMINISTRADOR. INOCORRÊNCIA. Nos termos do art. 1º da Lei nº 6.839/80, o critério para aferir a obrigatoriedade de registro em conselhos de fiscalização e a contratação de profissional específico é a atividade básica desenvolvida ou a natureza dos serviços prestados pela empresa a terceiros. O fato de o apelado desenvolver algumas das atividades  referidas na legislação que rege o exercício da profissão de  administrador, não significa que tais atividades devam ser  exercidas unicamente por administradores. Atividades relacionadas à área de atendimento a clientes, gerente de vendas, financeiro e de recursos humanos e gerente de marketing não são exclusivas de administradores. (TRF4 5002533-93.2018.4.04.7200, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 03/10/2018, destacado)

Especificamente sobre a possibilidade de cancelamento do registro, imperioso registrar que o TRF da 4ª Região vem se posicionando no sentindo de que o direito de desligar-se dos conselhos de fiscalização profissional é livre, bastando a manifestação de vontade do inscrito, não podendo ser condicionado nem à prova do não exercício da profissão, nem ao pagamento de anuidades, sob pena de afronta ao art. 5º, incisos II e XX, da CF/88. Confira-se:

CONSELHO PROFISSIONAL. CORECON. CANCELAMENTO. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DANO MORAL. HONORÁRIOS. 1. O art. 5º, incisos II e XX, da CF estabelecem que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, e que ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado, não podendo o CORECON/RJ obrigar o profissional a manter-se filiado, até porque, caso venha a ocorrer o exercício ilegal da profissão, poderá o conselho, através de sua atividade de fiscalização, aplicar as sanções legalmente previstas. 2. No caso dos autos, restou caracterizado o dano moral com a negativa do Conselho em cancelar a inscrição do autor. 3. A Terceira Turma desta Corte tem o entendimento consolidado pela fixação dos honorários em 10% sobre o valor da causa, desde que não configure valor ínfimo ou exorbitante. (TRF4, APELREEX 5049623-82.2013.404.7100, Terceira Turma, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, Data da Decisão: 24/02/2016, destacado)

TRIBUTÁRIO. CORECON/RS. ANUIDADES. PESSOA JURÍDICA. FATO GERADOR. ATIVIDADE BÁSICA. INATIVIDADE. MENOS DE QUATRO ANUIDADES. LEI 12.514/2011. CANCELAMENTO DO REGISTRO. […] 3. Prevê a Constituição Federal que é livre o exercício profissional, desde que atendidas as qualificações profissionais que a Lei estabelecer e que é plena a liberdade de associação para fins lícitos, (art. 5º, XIII, XVII), e também disciplina a liberdade de se desassociar, haja vista que ninguém pode ser compelido a permanecer associado (vide art. 5º, XX, CF/88). Assim, a autora, por não exercer profissão vinculada ao conselho Profissional, não pode ser obrigada a manter-se nele filiada. 4. Caso em que determinado o cancelamento da inscrição profissional junto ao conselho, sem a necessidade de recolhimento das anuidades vencidas e não pagas, tendo em vista que a empresa não estava no efetivo exercício da sua profissão no período controverso. 5. Apelação improvida. (TRF4, AC 5020026-34.2014.404.7100, Primeira Turma, Relatora MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, Data da Decisão: 16/03/2016, destacado)

Sem embargo, a liberdade de associação é direito fundamental que deve ser sempre resguardada, de modo que ninguém pode ser compelido a associar-se ou a permanecer associado (art. 5º, inciso XX, da Constituição Federal). O pedido de cancelamento da inscrição é verdadeiramente suficiente para que a empresa ou o profissional se desvincule do órgão de fiscalização profissional ao qual esteja ligado. Isso em nada atenta contra o poder-dever de fiscalização atribuído a tais órgãos, que devem fiscalizar e detectar o eventual exercício ilegal (inclusive por ausência da necessária inscrição) da profissão, em sendo o caso.

Assentados os contornos jurídicos sobre a questão, passo ao exame do caso concreto.

Na hipótese dos autos, a empresa autora foi autuada pelo réu, que entende que o objeto social da pessoa jurídica se enquadra nas funções inerentes à profissão de administrador, pelo que deveria a empresa se cadastrar no CRA-RS.

O objeto social da empresa e suas atividades são assim descritos no cadastro perante a Junta Comercial do RS, conforme processo administrativo – 04/11/2021 (evento 1, PROCADM4):

Posteriormente, conforme a 13ª Alteração do Contrato Social, notadamente em sua Cláusula 4ª, levado a efeito junto à JUCERS, em 01/04/2022, é o objeto social da empresa (evento 1, CONTRSOCIAL3, fl. 06):

A parte autora entende que, por estar inscrita na Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais, assim como autorizada a operar pela Comissão de Valores Imobiliários – CVM, uma vez que sua atividade principal seria a de assessoramento de terceiros para alocação de valores em fundos de investimentos e demais atividades específicas no mercado de capitais, não necessita estar inscrita perante o CRA. Defende que é uma gestora de recursos independente, focada em gerar valor para os seus clientes, vinculando-se ao órgão que tenha o poder de fiscalizar quem utiliza de valores para investimentos, sendo este a “Associação Brasileira de Entidades dos Mercados Financeiros e Capitais”, assim como a Comissão de Valores Imobiliários – CVM.

Já o CRA, por seu turno, defende:

“Analisando o Objeto Social da empresa, onde consta: “Prestação de serviços de assessoria financeira, de estruturação e reestruturação de projetos e empresas, a administração de recursos próprios e/ou de terceiros, a administração de carteira de investimentos, a gestão de fundos de investimento, a assessoria e consultoria na área de engenharia e na área de administração de empresas, bem como a participação em outras sociedades na qualidade de acionista ou socia e/ou em fundos, na qualidade de quotista..”, constatamos que as atividades desenvolvidas são inerentes a Profissão de Administrador no que tange a “ORGANIZAÇÃO E MÉTODOS e Programas de Trabalho e ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA”.
De acordo com o art. 2º, alínea “b” e art. 15 da Lei 4.769/65; § 2º do art. 12 do Regulamento aprovado pelo Decreto nº 61.934/67, essas atividades somente podem ser desenvolvidas legalmente por empresa registrada neste Conselho Regional de Administração.”

In casu, tenho que a razão está com o CRA.

Ora, a prestação de serviços de assessoria financeira, de estruturação e reestruturação de projetos e EMPRESAS e a assessoria e consultoria na área de ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS são atividades inerentes à Profissão de Administrador, conforme prevê o art. 2º, alínea “b”, e art. 15 da Lei 4.769/65; e o art. 12, §2º, do Regulamento aprovado pelo Decreto nº 61.934/67. Tais atividades somente podem ser desenvolvidas legalmente por empresa registrada no Conselho Regional de Administração.

O fato de a parte autora atuar na área de administração de valores mobiliários, o que a sujeita a registro na Comissão de Valores Mobiliários e ao pagamento da taxa de fiscalização respectiva, não exclui a obrigatoriedade de registro concomitante no Conselho, decorrente da “prestação de serviços de assessoria financeira, de estruturação e reestruturação de projetos e EMPRESAS; e da “assessoria e consultoria na área de ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS”.

A meu sentir, a existência de registro na CVM não se equipara à situação de registros concomitantes em dois conselhos profissionais, na medida em que a CVM não é um conselho profissional, mas sim uma autarquia vinculada ao Ministério da Economia responsável pela regulamentação e fiscalização do mercado de valores mobiliários. Não se aplica in casu, portanto, a jurisprudência do STJ que veda a superposição de registro em mais de um conselho profissional pela mesma empresa. Lado outro, a ANCORD (Associação Nacional das Corretoras e Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários, Câmbio e Mercadorias) trata-se de uma associação criada para representar os profissionais do mercado financeiro e de capitais no Brasil e também não é um conselho profissional.

Demonstrada a correlação da atividade da empresa e aquela objeto de fiscalização pelo Conselho, correta a exigência de obrigatoriedade de inscrição e demais consectários.

Dessa forma, não merece prosperar o pedido da parte autora.

(…)

I – Preliminares

Aponta a existência de vício insanável na instrução processual, que teria deixado de considerar o argumento principal da parte apelante: a sua atividade principal é movimentação de recursos financeiros para investimento, devendo ser regulada pela autarquia que detém capacidade para tanto.

Acerca da nulidade da decisão por ausência de fundamentação suscitada, com efeito, a Constituição Federal exige, no art. 93, IX, que o juiz ou o tribunal dê as razões de seu convencimento, ainda que sucintamente.

Os fundamentos integram os requisitos essenciais da decisão, pressupondo análise das questões de fato e de direito (inteligência do art. 11 c/c 489, II, § 1º, IV, do CPC).

Assim, é necessário que o julgador apresente as razões de seu convencimento, identificando as bases fáticas e jurídicas que justificam o deferimento ou o indeferimento do pedido, sob pena de nulidade.

No presente caso, o julgador singular indicou as razões de seu convencimento. O fato de não ter acolhido a pretensão do apelante não significa que os argumentos trazidos não tenham sido analisados e valorados, não implicando em  ofensa ao art. 93, IX, da Constituição Federal. 

Tenho, então, que a preliminar não merece ser acolhida.

II – Mérito

Conforme o cadastro perante a Junta Comercial do RS, a atividade principal da empresa apelante é na área de consultoria em gestão empresarial, atividade inerente à profissão de administrador, conforme o delineado no art. 2º, alínea “b” e art. 15 da Lei 4.769/65. 

Quanto à vedação de superposição de registro em mais de um conselho profissional pela mesma empresa, a existência de registro na CVM não se equipara à situação de registros concomitantes em dois conselhos profissionais, na medida em que a CVM não é um conselho profissional, mas sim uma autarquia vinculada ao Ministério da Economia responsável pela regulamentação e fiscalização do mercado de valores mobiliários, conforme já esclarecido pelo magistrado de origem.

Isto posto, penso que a sentença deve ser mantida.

Por fim, consoante entendimento consolidado no STJ, majoro em um ponto percentual a verba anteriormente fixada, em atenção ao que dispõe o artigo 85, §11, do CPC.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.

EMENTA

Administrativo. APELAÇÃO. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO AFASTADA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE PRIVATIVA DE ADMINISTRADOR. desequiparação de duplo registro em conselhos profissionais. 

1. A atividade principal da empresa apelante é na área de consultoria em gestão empresarial, atividade inerente à profissão de administrador, conforme o delineado no art. 2º, alínea “b” e art. 15 da Lei 4.769/65. 

2. A existência de registro na CVM não se equipara à situação de registros concomitantes em dois conselhos profissionais, na medida em que a CVM não é um conselho profissional, mas sim uma autarquia vinculada ao Ministério da Economia responsável pela regulamentação e fiscalização do mercado de valores mobiliários.

 

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

[…]

(TRF4- Apelação Cível Nº 5017915-96.2022.4.04.7100/RS. Relator Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE– Julgado em: 27/9/2023)