SENTENÇA. VISANDO NULIDADE DE DÉBITO JUNTO AO CRA. CONSTATADA A REGULARIDADE DA COBRANÇA. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE.

SENTENÇA

I – RELATÓRIO

Trata-se de Ação Ordinária movida por DANIEL ARAÚJO MAIA, devidamente qualificado e representado nos autos, em face do CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO – BAHIA, visando obter provimento jurisdicional que declare a nulidade do débito junto ao réu no período de 2019 a 2022, sendo determinada a baixa no registro profissional n. 2-01334.

Relata o autor que, em 31/01/2019, protocolou junto ao Conselho Regional de Administração-BA (protocolo nº 1085/2019) solicitação de licença/cancelamento do registro profissional de tecnólogo (CRA/BA nº 2-01334), tendo o réu lhe enviado, em 29/07/2019, correspondência na qual informava o inderimento do pedido, sob o argumento de que ele ocupa cargova de gerente de RH.

Afirma que foi surpreendido ao receber boleto de cobrança no valor de R$ 1.511,47 (mil, quinhentos e onze reais e quarenta e sete centavos) e, ao buscar informações junto ao CRA/BA, foi constatado que o seu registro continuava ativo e na situação de inadimplente, e que o protocolo de solicitação de cancelamento nunca foi atendido.

Alega que, conforme declaração do seu ex-empregador, não se exigia formação acadêmica de Administrador para ocupar o cargo de gerente de RH, e sim, a formação acadêmica técnica na área administrativa ou de Recursos Humanos ou curso superior de Recursos Humanos ou curso superior na área administrativa, não lhe tendo sido exigido registro ativo no CRA. Ressalta que tem uma inscrição na qualidade de tecnólogo, não sendo exigível, na época, para o exercício do cargo, a formação escolar de nível superior, não havendo impedimento para o pedido de cancelamento do registro profissional, até porque, não se exige responsabilidade técnica para esse profissional. Sustenta, por fim, que o seu contrato de trabalho foi encerrado em 08/10/2019, desligando-se completamente da sua antiga função exercida junto à empresa AT Construções.

Requer o benefício da assistência judiciária gratuita

Inicial instruída com procuração e documentos.

A decisão de id. 907258091 indefere o pedido de tutela de urgência.

Citado, o Conselho Regional de Administração da Bahia apresenta contestação (id. 1093441295), na qual impugna a gratuidade de justiça. Afirma que em análise pela Plenária do CRA-BA e em consonância com documentação juntada pelo próprio Autor, ficou constatado que ele ocupava o cargo de Gerente de Recursos Humanos, com atribuições que se enquadram nos campos privativos dos Profissionais de Administração, conforme dispõe o art. 2º, b, da Lei 4.769/65. Alega que o fato gerador das anuidades ocorre mediante a inscrição do sujeito passivo no respectivo conselho de fiscalização profissional, não fazendo a legislação nenhuma referÇencia ao efetivo exercício da atividade profissional fiscalizada pelo conselho. Defende a legalidade da cobrança das anuidades e assevera ter sido assegurado ao autor o direito ao contraditório e à ampla defesa no âmbito administrativo, tendo sido inscrito o débito na dívida ativa. Por fim, requer a improcedência dos pedidos autorais.

O autor se manifesta em Réplica (id. 1620741894).

Vieram os autos conclusos.

É o Relatório. Passo a dispor.

II – FUNDAMENTAÇÃO

O caso comporta o julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355 do Código de Processo Civil, uma vez que não há necessidade de serem produzidas mais provas, além dos documentos já constantes dos autos.

Impugnação ao pedido de gratuidade de justiça.

Consoante o art. 99 do CPC, “presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural” (§3º), de modo que “o juiz só pode indeferir o benefício de houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade…” (§2º). Na hipótese, não se desincumbiu o réu em coligir documentos aptos a provar a inexistência ou o desaparecimento dos requisitos essenciais à sua concessão.

Desse modo, rejeito a impugnação à justiça gratuita manejada pelo réu.

Superada a preliminar, passo ao exame do mérito.

Da análise dos autos, não vislumbro no feito razões para variar do entendimento firmado na decisão de id. 907258091. Explico.

O cerne da controvérsia reside na análise da legalidade da cobrança das anuidades do período de 2019 a 2022 junto ao Conselho Regional de Administração da Bahia, que resultou na incrição do referido débito na dívida ativa.

De acordo com as informações prestadas pela então empregadora do Autor ao Conselho de Administração (id. 888032090), este trabalhava na empresa desde 27/06/2011, na função de Gerente de Recursos Humanos, cujas atribuições descritas encontram-se no âmbito da administração de pessoal. Vejamos:

 

(…) atribuições inerentes ao cargo: Supervisionar rotinas admnistrativas; Gerenciar folha de pagamento; Gerenciar contratação de pessoal e rescisão contratual; Gerenciar movimentação de pessoal; Gerenciar ações trabaçhistas; Analisar contratos de trabalho; gerenciar documentações legais; Elaborar procedimentos para cumprir as convenções coletivas; Gerenciar Contratos de estagiários e terceiros; Gerenciar Custo de mão-de-obra; Negociar acordos com entidades sindicais e de relações tarbalhistas; Prestar informações à fiscalização do trabalho; Consultar fontes jurídicas CBO 142205 referente ao cargo ocupado.

 

O art. 2º da Lei nº 4.769/65, ao tratar a atividade profissional de Técnico em Administração, dispõe que:

Art 2º A atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, VETADO, mediante:

a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;

b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e contrôle dos trabalhos nos campos da administração VETADO, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que êsses se desdobrem ou aos quais sejam conexos;

c) VETADO.

Art 3º O exercício da profissão de Técnico de Administração é privativo:

a) dos bacharéis em Administração Pública ou de Emprêsas, diplomados no Brasil, em cursos regulares de ensino superior, oficial, oficializado ou reconhecido, cujo currículo seja fixado pelo Conselho Federal de Educação, nos têrmos da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961;

b) dos diplomados no exterior, em cursos regulares de Administração, após a revalidação do diploma no Ministério da Educação e Cultura, bem como dos diplomados, até à fixacão do referido currículo, por cursos de bacharelado em Administração, devidamente reconhecidos;

c) dos que, embora não diplomados nos têrmos das alíneas anteriores, ou diplomados em outros cursos superiores e de ensino médio, contem, na data da vigência desta lei, cinco anos, ou mais, de atividades próprias no campo profissional de Técnico de Administração definido no art. 2º. (Parte vetada e mantida pelo Congresso Nacional) Parágrafo único.

A aplicação dêste artigo não prejudicará a situação dos que, até a data da publicação desta Lei, ocupem o cargo de Técnico de Administração, VETADO, os quais gozarão de todos os direitos e prerrogativas estabelecidos neste diploma legal.

 

Por sua vez, a comunicação de indeferimento ao pedido de cancelamento de registro é datada de 29/07/2019 e está fundamentada na constatação de que o Autor ocupava o cargo de Gerente de RH, cuja escolaridade exigida é o nível superior em Administração, com atribuições que se enquadram nos campos privativos do Administrador.

Conforme esclarecido na decisão que indeferiu o pedido de tutela de urgência, não se desconhece que a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 1ª Região tem entendimento de que o cancelamento de registro não pode ser obstado, ainda que por existência de anuidades em atraso, caso se demonstre que não há exercício de atividade profissional típica de Administrador conforme dispõe a Lei nº 4.769/65 (art.2º).

Por outro lado, não se pode afirmar que o Autor foi surpreendido com a cobrança das anuidades em aberto, pois ele tinha conhecimento do indeferimento do seu pedido de cancelamento de registro. Ademais, ciente de que o óbice era o exercício da atividade profissional de gerente de RH, com o seu desligamento em outubro de 2019, poderia ter apresentado novo pedido ao Conselho, caso não tivesse dado continuidade ao exercício da atividade profissional sujeita ao controle da entidade.

Reitere-se, ainda, que a natureza da atividade profissional exercida e sua compatibilidade com as atividades típicas de administrador, sujeitas ao poder de polícia do Conselho profissional em questão não são determinadas pelas informações da empregadora, mas por lei, no caso a Lei nº 4.769/65. O fato de o Autor possuir registro de tecnólogo também, em princípio, não altera a obrigatoriedade de fiscalização de sua atividade típica de Administrador.

 

Cumpre registrar que aos litigantes em processo administrativo são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os recursos a ela inerentes, conforme previsto no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal. Deste modo, a Administração Pública deverá obedecer aos princípios da ampla defesa e do contraditório (art. 2º, caput, da Lei nº 9.784/1999), em homenagem ao devido processo legal (art. 5º, LIV, da CF).

Incabível, destarte, o controle jurisdicional do ato administrativo, no que se refere ao seu mérito, ou seja, quanto aos critérios de conveniência e oportunidade que inspiraram o Administrador a agir.

Constatada a regularidade do procedimento administrativo, que apreciou o pedido do autor, assegurando-lhe o exercício do contraditório e da ampla defesa, e evidenciada a legalidade da cobrança, não há como se anular o débito referente às anuidades do período de 2019 a 2022.

Do exame do conjunto probatório dos autos, verifico que a parte autora não logrou êxito em comprovar os fatos constitutivos do seu direito narrado na petição inicial, ônus que lhe competia, à luz do que dispõe o inciso I do artigo 373 do Código de Processo Civil. Inexiste nos autos qualquer elemento de prova hábil a desconstituir o débito referente às anuidades cobrado pelo Conselho réu.

Destarte, dados os contornos fáticos e jurídicos da lide, a improcedência dos pedidos é medida de rigor.

III – DISPOSITIVO

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

[…] (TRF3- PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL- 1002678-28.2022.4.01.3300, Seção Judiciária da Bahia 3ª Vara Federal Cível da SJBA, EDUARDO GOMES CARQUEIJA Juiz Federal Titular, promulgado em 14/09/2023)