SENTENÇA. INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. COBRANÇA DE ANUIDADES DEVIDA. NÃO RECONHECIDO ILEGALIDADES NO PROCESSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE.

SENTENÇA

Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA proposta por JULIANA DE FATIMA MORAES ROSA, em face do CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO DE SÃO PAULO, pretendendo tutela de urgência para determinar a retirada da negativação do nome da autora junto aos órgãos SCPC e SERASA, bem como suspensão de protesto indevido até definitiva decisão judicial.

Segundo narra a inicial, a autora pretende discutir a cobrança de taxa de anuidade de inscrição junto ao Conselho réu, referente aos últimos cinco anos, havendo manifesta ilegalidade na sua exigência, uma vez que se trataria de inscrição indevida, por manifestamente incompatível com as atividades que a requerente exerce há mais de 10 (dez) anos.

Aduz que a requerente ingressou na faculdade de administração, e era necessário/obrigatório para referido curso que os alunos se inscrevessem no CRA– Conselho Regional de Administração, tendo a autora feito a inscrição; afirmando, no entanto, que a inscrição teria validade apenas para ano letivo de 2012.

Assevera que, todavia, o réu tem realizado a cobrança de todos os anos desde a filiação da autora até o presente momento, mesmo a requerente tendo avisado por mais de uma vez que não teria interesse de manter-se afiliada por não exercer a função, sendo realizado protesto e negativação de seu nome sob alegação de inadimplemento.

Aduz que a autora nunca exerceu a função correspondente, conforme pode ser comprovado em sua CTPS, e como foi mencionado em notificação extrajudicial; logo, entende que não há a prestação de serviços próprios da profissão de Administrador, não havendo razão para sua sujeição ao Conselho Regional de Administração.

Ao final requereu a total procedência da pretensão para declarar a nulidade da multa aplicada e anuidades cobradas, e consequente declaração de não obrigatoriedade de registro junto ao Conselho; a inexigibilidade de todo e qualquer débito em relação ao Conselho Regional de Administração; e a condenação da ré a indenizar a Autora, a título de danos morais, no importe mínimo de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Com a inicial vieram os documentos juntados ao processo eletrônico.

A decisão ID nº 246329861 indeferiu o pedido de tutela de urgência.

Conforme ID nº 253970122 restou comprovado que a parte autora protocolou agravo de instrumento perante o Tribunal Regional Federal da 3ª Região sob o nº 5013194-88.2022.4.03.0000, sendo indeferido o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal.

O Conselho Regional de Administração de São Paulo – CRA/SP foi citado e apresentou contestação constante no ID nº 254260536, sem alegação de preliminares. Quanto ao mérito, pugnou pela improcedência da pretensão, inclusive quanto aos danos morais requeridos.

A réplica foi acostada conforme ID nº 256600192.

Devidamente intimadas acerca da necessidade de produção de provas, a parte autora disse não ter provas a produzir (ID nº 256600192) e o Conselho também informou não ter provas a produzir (ID nº 256505667).

A decisão ID nº 256665198 aduziu que, tendo em vista que as partes não requereram a produção de provas, é aplicável o inciso I do artigo 355 do Código de Processo Civil de 2015, determinando que os autos viessem conclusos para sentença.

A seguir, os autos vieram-me conclusos.

É o relatório. DECIDO.

 

FUNDAMENTAÇÃO

Verifico estarem presentes os pressupostos processuais de validade e existência da relação processual, bem como a legitimidade e o interesse e processual.

Embora o valor da causa fixado por este juízo na decisão ID nº 246329861 seja inferior a sessenta salários mínimos, a pretensão deduzida nesta ação diz respeito à anulação de ato administrativo federal que não abrange matéria previdenciária e não corresponde a lançamento fiscal; pelo que este Juiz se dá por competente para processar e julgar o feito, de acordo com o disposto no artigo 3º, parágrafo 1º, inciso III, da Lei nº 10.259/2001.

Há que se julgar antecipadamente a lide, uma vez os fatos só podem ser comprovados por documentos que foram juntados durante o tramitar da relação processual, sendo, assim, desnecessária a dilação probatória com a designação de audiência ou determinação de realização de perícia, conforme consta expressamente no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, e já consignado na decisão ID nº 256665198.

Destarte, aprecia-se o mérito a pretensão.

No mérito, observa-se que a autora, formada em Administração de Empresas com ênfase em Finanças e Controladoria, requereu a sua inscrição no Conselho de Administração de Empresas, conforme provado em ficha de registro anexada aos autos no ID nº 246181861, página 01, pelo que resta evidente que tinha plena ciência de que estava se registrando no órgão responsável pela fiscalização do exercício profissional do Administrador.

No que tange à questão ventilada pela parte autora, relacionada unicamente com a ausência do exercício da profissão de administradora, este juízo tem entendimento de que a relação jurídica existente entre o inscrito e a entidade de fiscalização profissional somente termina a partir do momento em que o indivíduo inscrito no conselho elabora e protocola requerimento solicitando o fim da relação jurídica, devendo tal solicitação ser homologada e ser devidamente instruída com os documentos pertinentes.

Nesse ponto, consigne-se que o fato de a parte autora eventualmente não exercer atividades relacionadas à administração de empresas, não tem o condão de cancelar automaticamente sua inscrição junto ao Conselho Regional de Administração.

Note-se que as anuidades para os Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional têm natureza tributária, e, que, portanto, o fato gerador para a cobrança das anuidades decorre da simples inscrição do profissional no Conselho, em atenção ao princípio da legalidade.

Nesse sentido, a matéria é regulada pelo Art. 5º, da Lei nº 12.514/2011, vigente desde 31/10/2011, que dispõe que “o fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício”.

Assim, a pessoa que estiver efetivamente inscrita no órgão de classe, por continuar a gozar dos direitos inerentes à inscrição, deve arcar com os ônus dela decorrentes, sendo responsável pelo pagamento das anuidades. Somente com o regular cancelamento da inscrição, cessa a obrigação tributária do profissional e, consequentemente, a cobrança de anuidades.

Em sendo assim, somente com a indispensável comprovação de que a parte autora peticionou e entregou os documentos necessários junto a autarquia requerendo o seu desligamento, é que pode ser cessada a exigência legal de pagar as anuidades ao conselho profissional.

Neste caso, conforme documento datado do ano de 2021 juntado no ID nº 246181861, página 02, resta provado que a autora não solicitou o cancelamento de sua inscrição.

Portanto, não há que se falar na inviabilidade da cobrança das anuidades desde o ano de 2012, ficando a parte autora vinculada ao conselho réu até a data em que externar seu pedido expresso de cancelamento.

Neste ponto, considere-se que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu, em seu artigo 5º, inciso XX, o direito fundamental à plena liberdade de associação profissional, uma vez que “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”. Optando pela associação, surge para o indivíduo a obrigação de pagamento de anuidade à entidade de classe, independentemente do efetivo exercício da profissão.

Outrossim, interpretando o preceito constitucional acima citado, chega-se à conclusão de que, da mesma forma que o profissional possui a ampla liberdade de associar-se, também tem a liberdade de se desvincular dos quadros da entidade. Tal desvinculação não prescinde de um pedido formal de cancelamento, sendo que tal pedido só produz efeitos “ex nunc”.

Portanto, ao ver deste juízo, viável juridicamente neste caso a exigência das anuidades desde 2012.

Por outro lado, no que tange ao pedido de danos morais, a conduta que teria causado danos à parte autora está relacionada com o fato de o Conselho ter procedido com a inscrição da autora no cadastro de inadimplentes, e ter efetuado protesto da dívida, aduzindo que houve abuso.

No caso do Conselho réu “o dano só é reparável pela Administração Pública causadora do evento se for certo (possível, real, efetivo, aferível, presente – exclui-se, pois, o dano eventual, i.e., o que poderá acontecer), especial (individualizado, referido à vítima, pois, em geral, configuraria ônus comum à vida em sociedade), anormal (excedente aos inconvenientes naturais dos serviços e encargos decorrentes do viver em sociedade), referente a uma situação protegida pelo direito (incidente sobre uma atividade lícita; não são protegidos, por exemplo, os danos decorrentes da destruição de uma plantação de maconha) e de valor economicamente apreciável (não tem sentido a indenização de dano de valor econômico irrisório). O dano que não apresentar, ao mesmo tempo, essas características não é reparável pelo Poder Público que lhe deu causa”, consoante ensinamento constante na obra Direito Administrativo, de autoria do mestre Diógenes Gasparini, editora Saraiva, 9ª edição, página 877.

No caso destes autos, verifica-se que faltam os requisitos “anormalidade” e “referente a uma situação protegida pelo direito “ para que o dano seja indenizável, visto que não existe qualquer ilicitude em protestar dívida líquida e certa e encaminhar o nome da parte devedora para cadastros de inadimplentes, não sendo possível o pagamento de danos morais.

Conforme acima aduzido, a dívida da autora para com o conselho réu é legítima e lícita, de modo que não existe qualquer dano moral a ser indenizado se o conselho seguiu estritamente o ordenamento jurídico ao protestar certidão em dívida ativa e encaminhar o nome da requerente aos cadastros por inadimplência, decorrente de dívida líquida, certa e exigível.

 

DISPOSITIVO

Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado pela parte autora, e resolvo o mérito da questão, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

A parte autora está dispensada do pagamento das custas e dos honorários advocatícios, tendo em vista ter efetuado pedido para usufruir os benefícios da assistência judiciária gratuita, deferido no ID nº 246329861. Aplica[1]se, ao caso, o §3º do artigo 98 do Código de Processo Civil, em relação às obrigações decorrentes da sucumbência da parte autora.

Oficie-se ao douto Relator do Agravo de Instrumento n.º 5013194- 88.2022.4.03.0000, informando a prolação da presente sentença.

Cópia desta sentença servirá como ofício ao douto Relator do Agravo de Instrumento n.º 5013194-88.2022.4.03.0000 , que deverá ser encaminhado por meio eletrônico.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se.

 

[…]. (TRF3 – 1ª Vara Federal de Sorocaba, PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5001761-90.2022.4.03.6110, juiz federal MARCOS ALVES TAVARES, julgado em: 12/08/2022)