EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. REGISTRO. OBRIGATORIEDADE.

RELATÓRIO

Trata-se de apelação do Conselho Regional de Administração do Rio Grande do Sul – CRA/RS contra sentença da MM. Juíza Federal Substituta Marila da Costa Perez, da 23ª Vara Federal de Porto Alegre – RS, que julgou procedentes os embargos e extinguiu a execução de dívida ativa, reconhecendo a inexigibilidade da multa aplicada em razão da ausência de registro da pessoa jurídica no conselho exequente (evento 41).

Sustenta que as atividades da embargante são inerentes ao campo profissional da administração, razão pela qual sua inscrição na autarquia é obrigatória. Requer o provimento do recurso a fim de que seja reformada a sentença (evento 47).

Com contrarrazões (evento 51), subiram os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Segundo dispõe a Lei nº 6.839, de 1980, é obrigatório o registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros.

Cabe, pois, verificar se a embargante está mesmo obrigada a registro no Conselho Regional de Administração. Deste modo, a solução da controvérsia passa pela análise do art. 2º da Lei nº 4.769, de 1965:

Art. 2º A atividade profissional de Técnico de administração será exercida, como profissão liberal ou não, mediante:

a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;

b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos da administração, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que esses se desdobrem ou aos quais sejam conexos.

Por sua vez, a empresa executada tem como objeto social (evento 36 – contrsocial3, pág. 4):

“CLÁUSULA SEGUNDA – Do Objetivo Social.

O objetivo da sociedade constitui-se em:

a) prestar, em caráter cumulativo e contínuo, serviços de análise e gestão de crédito, de orientação mercadológica, de acompanhamento de contas a receber (FACTORING);

b) adquirir créditos (direitos) de empresas resultantes de venda de seus produtos, mercadorias ou prestação de serviço (FACTORING);

c) efetuar negócios de factoring no comércio internacional de importação e exportação;

d) prestar serviços de consultoria e assessoria empresarial e revitalização de empresas;

e) prestar serviços como promotora de vendas;

f) prestar serviços de cobrança extra judicial;

g) desenvolver tecnologia nas áreas de serviços bancários e financeiros.”

Pois bem.

Embora seja inexigível a inscrição de pessoas jurídicas que se dedicam à atividade de factoring nos conselhos regionais de administração, o caso dos autos reclama solução diferente. É que a embargante, além de realizar operações de fomento mercantil, também possui como objeto social a prestação de serviços de consultoria e assessoria empresarial, atividades que demandam técnicas cujo objetivo é o desenvolvimento de empresas – ou, nos termos do contrato social anexado nos autos, a revitalização de empresas.

Está claro que não se olvida que a aquisição de direitos creditórios de outras pessoas jurídicas é eminentemente comercial; contudo, não se pode confundir este tipo de atividade com o serviço de consultoria e assessoria empresarial e revitalização de empresas, que demandam técnicas de análise, planejamento e organização, típicas do campo da administração.

Assim, está demonstrado nos autos que a embargante não se dedica apenas à atividade de factoring, mas também àquelas privativas do técnico de administração, nos termos do art. 2º da Lei nº 4.769, de 1965, razão pela qual é imprescindível sua inscrição no conselho exequente, sendo exigível a multa imposta.

Saliento que este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, ilustrado pelos seguintes julgados:

ADMINISTRATIVO. EMPRESA QUE SE DEDICA À ATIVIDADE DE FACTORING.
REGISTRO NO RESPECTIVO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO.
1. A Primeira Seção, no julgamento do EREsp 1.236.002/ES, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, consignou que os escritórios de factoring não precisam ser registrados nos conselhos regionais de administração quando suas atividades são de natureza eminentemente mercantil – ou seja, desde que não envolvam gestões estratégicas, técnicas e programas de execução voltados a um objetivo e ao desenvolvimento de empresa. 2. De acordo com o referido julgado, a inscrição é dispensada em casos em que a atividade principal da empresa recorrente consiste em operação de natureza eminentemente mercantil, prescindindo, destarte, de oferta às empresas-clientes de conhecimentos inerentes às técnicas de administração ou de administração mercadológica ou financeira. Ficou ainda esclarecido que não há “se comparar a oferta de serviço de gerência financeira e mercadológica – que envolve gestões estratégicas, técnicas e programas de execução voltados a um objetivo e ao desenvolvimento da empresa – com a aquisição de um crédito a prazo pela solvabilidade dos efetivos devedores dos créditos vendidos”. 3. No caso dos autos, o Tribunal local, analisando o contrato social da empresa, apontou as seguintes atividades desenvolvidas pela recorrente: “‘a) prestação de serviços, em caráter contínuo, de alavancagem mercadológica ou de acompanhamento das contas a receber e a pagar ou de seleção e avaliação dos sacados devedores ou dos fornecedores das empresas-clientes contratantes; b) conjugadamente, na compra, à vista, total ou parcial, de direitos resultantes de vendas mercantis e/ou de prestação de serviços realizadas a prazo por suas empresas clientes-contratantes; c) realização de negócios de factoring no comercio internacional de exportação e importação; d) participação em outras sociedades como sócia, acionista ou quotista; e) prestação de serviços de assessoria empresarial’ (cláusula terceira do contrato social de 3/3/2004, fls. 48/69; cláusula terceira da alteração do contrato social de 22/2/2005, fls. 70/93)”. 4. Sendo certo que as atividades da empresa não se enquadram apenas como factoring convencional, é mister a inscrição no Conselho Regional de Administração.
5. Recurso Especial não provido. (REsp 1587600/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/05/2016, DJe 24/05/2016).

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PRELIMINAR. MATÉRIA NÃO ALEGADA OPORTUNAMENTE. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. FACTORING. FOMENTO MERCANTIL. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. INSCRIÇÃO. DESNECESSIDADE. 1. A matéria que não foi abordada no momento oportuno não pode ser conhecida, ante a preclusão consumativa. 2. A Primeira Seção desta Corte Superior de Justiça, quando do julgamento dos EREsp n. 1.236.002/ES, da relatoria do Min. Napoleão Nunes Maia Filho, fixou o entendimento segundo o qual é desnecessária a inscrição das empresas de factoring nos conselhos regionais de administração nas hipóteses em que as respectivas atividades tenham natureza eminentemente mercantil, isto é, não abarquem gestões estratégicas, técnicas e programas de execução cujo objetivo seja o desenvolvimento de empresas. 3. Hipótese em que o Tribunal de origem concluiu que a atividade desenvolvida pela empresa destina-se privativamente ao fomento mercantil. 4. O recurso manifestamente improcedente atrai a multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, na razão de 1% a 5% do valor atualizado da causa. 5. Agravo interno desprovido, com aplicação de multa (AgInt no REsp 1681860/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/05/2018, DJe 03/08/2018).

Impõe-se, assim, reformar a sentença, devendo a execução de dívida ativa prosseguir nos termos em que proposta, ficando, em decorrência do resultado do julgamento, invertidos os encargos de sucumbência.

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.

 

[…]. (TRF4 – TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5075527-36.2015.4.04.7100/RS, desembargador federal RÔMULO PIZZOLATTI, julgado em: 20/11/2019)