AGRAVO INTERNO. ATIVIDADES QUE EXTRAPOLAM AS PREVISTAS NA MODALIDADE “FACTORING CONVENCIONAL”. MANUTENÇÃO DA EXIGIBILIDADE DE REGISTRO JUNTO AO CRA.

E M E N T A

AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO. ART. 1.021, § 3º DO NCPC. REITERAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.

– A vedação insculpida no art. 1.021, §3º do CPC/15 contrapõe-se ao dever processual estabelecido no §1º do mesmo dispositivo.

– Se a parte agravante apenas reitera os argumentos ofertados na peça anterior, sem atacar com objetividade e clareza os pontos trazidos na decisão que ora se objurga, com fundamentos novos e capazes de infirmar a conclusão ali manifestada, decerto não há que se falar em dever do julgador de trazer novéis razões para rebater alegações genéricas ou repetidas, que já foram amplamente discutidas.

– Agravo interno desprovido.

DECISÃO

Trata-se de agravo interno interposto por  MAXICRED FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA, contra a decisão monocrática prolatada nos seguintes termos:

” Cuida-se de apelação, em sede de Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica Tributária (inexigibilidade de inscrição/registro junto ao Conselho Regional de Administração – CRA/SP e, consequentemente, declaração de nulidade do auto de infração nº 5006769 e respectivo processo nº 004523/2013, bem como nulidade da multa imposta por tal órgão), interposta pelo Conselho Regional de Administração do Estado de São Paulo, pleiteando a reforma da sentença a quo.

A r. sentença, julgou procedente o pedido, extinguindo o processo, com resolução do mérito (nos termos do art. 487, I do CPC), para o fim de declarar a inexistência de relação jurídica entre as partes, que obrigue o autor a se inscrever ou se manter inscrito perante o Conselho Regional de Administração de São Paulo, anulando as multas impostas por essa razão.

Apelou a ré, pugnando pela reforma da sentença, vez que as atividades desenvolvidas pela autora não se restringem à aquisição de título de crédito (executa atividades privativas de profissionais da área de administração), justificando-se, pois, a inscrição/registro, e as infrações decorrentes da omissão.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta C. Corte.

É o relatório.

Decido.

De início, cumpre explicitar que o art. 932, IV e V do CPC de 2015 confere poderes ao Relator para, monocraticamente, negar e dar provimento a recursos.

[…]

Assim, passo a proferir decisão monocrática, com fulcro no artigo 932, IV e V do Código de Processo Civil de 2015.

A apelante irresigna-se em face da decisão que declarou a inexistência de relação jurídica entre as partes, que obrigue o autor a se inscrever ou se manter inscrito perante o Conselho Regional de Administração de São Paulo, anulando as multas impostas por essa razão.

Para o deslinde da demanda, passo a uma breve digressão dos fatos.

A requerente possui como objeto de atuação descrito na cláusula segunda de seu contrato social: “efetuar negócios de fomento mercantil (factoring), que consiste em PRESTAR EM CARÁTER CUMULATIVO E CONTÍNUO, SERVIÇOS DE ANÁLISE E GESTÃO DE CRÉDITO, DE ACOMPANHAMENTO DE CONTAS A RECEBER E A PAGAR E OUTROS SERVIÇOS QUE VIEREM A SER SOLICITADOS PELA CLIENTELA, ADQUIRIR CRÉDITOS (DIREITOS) DE EMPRESAS RESULTANTES DA VENDA DE SEUS PRODUTOS, MERCADORIAS OU DE PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS E REALIZAR OPERAÇÕES INTER-FACTORING NO COMÉRCIO INTERNACIONAL DE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO.”, restando a mesma regularmente constituída em 04/08/09.

A autora foi notificada pela ré, na data de 07/06/13, para que realizasse sua inscrição perante o Conselho Regional de Administração – CRA/SP.

Em resposta, informou que não realizava qualquer atividade do ramo de administração, entendendo, pois, não ser obrigatório o registro no referido conselho e, por conseguinte, sendo indevido o recebimento da notificação.

Contudo, a autora foi autuada (Auto de Infração nº 5006769), com a decorrente imposição de penalidade (infração ao art. 1º da Lei nº 6839/80 c/c art. 15 da Lei nº 4769/65 e art. 12, §2º do Regulamento aprovado pelo Decreto nº 61934/67).

Passo à análise.

No que tange à controvérsia, a legislação (Lei nº 6839/80) responsável pelo registro de empresas nas entidades fiscalizadoras do exercício de profissões, dispõe, em seu artigo 1º, que o registro será obrigatório nas respectivas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros.

Por seu turno, o art. 3º do Decreto nº 61.934/67 e art. 2º da Lei nº 4769/65, dispõem, em síntese, sobre o exercício da profissão de Técnico de Administração e outras providências, e especificam, de forma taxativa, as atividades de competência do aludido profissional, a saber:

 “Art 3º – A atividade profissional do Técnico de Administração, como profissão, liberal ou não, compreende:

a) elaboração de pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens e laudos, em que se exija a aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de organização;

b) pesquisas, estudos, análises, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos de administração geral, como administração e seleção de pessoal, organização, análise métodos e programas de trabalho, orçamento, administração de matéria e financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais bem como outros campos em que estes se desdobrem ou com os quais sejam conexos;

c) o exercício de funções e cargos de Técnicos de Administração do Serviço Público Federal, Estadual, Municipal, autárquico, Sociedades de Economia Mista, empresas estatais, paraestatais e privadas, em que fique expresso e declarado o título do cargo abrangido;

d) o exercício de funções de chefia ou direção, intermediaria ou superior assessoramento e consultoria em órgãos, ou seus compartimentos, de Administração Pública ou de entidades privadas, cujas atribuições envolvam principalmente, aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de administração;

c) o magistério em matéria técnicas do campo da administração e organização.

E

Art 2º A atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, VETADO, mediante:

a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;

b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos da administração VETADO, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que esses se desdobrem ou aos quais sejam conexos (…)”

Para o caso sub judice, como alhures mencionado, as atividades desempenhadas pela apelada orbitam na categoria denominada: fomento mercantil (factoring), tratando-se de atividade comercial, mista e atípica, que, nos termos do art. 58 da Lei 9430/96, compreende a prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos, administração de contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring).

Neste universo, destacam-se,  dentre outras, as modalidades denominadas factoring convencional, que consiste nas atividades de compra de crédito (cessão de crédito) e prestação de serviços convencionais (análise de riscos dos títulos e cobrança de créditos da faturizada), e factoring trustee, que engloba as atividades da modalidade convencional, acrescidas da prestação de serviços de administração e assessoria financeira.

O Colendo Superior Tribunal de Justiça manifestou-se quanto à obrigatoriedade do registro das empresas de Factoring perante o Conselho Regional de Administração de São Paulo, nestes termos:

“As empresas de factoring convencional não precisam ser registradas nos conselhos regionais de administração, visto que suas atividades são de natureza eminentemente mercantil, ou seja, não envolvem gestões estratégicas, técnicas e programas de execução voltados para um objetivo e o desenvolvimento de empresa.” grifo nosso (edição 136 de Jurisprudência em Teses – tema: Conselhos Profissionais 2 – item nº 5 )

Observe-se que a prerrogativa tem caráter restritivo, não se estendendo as outras modalidades de factoring.

In casu, analisando minuciosamente o contrato social da apelada, observo que as atividades ali propostas extrapolam aquelas previstas na modalidade “factoring convencional”, vez que, dente outras, englobam: o acompanhamento de contas a pagar e receber ( assessoria financeira – factoring trustee, que, ademais, encontra-se inclusa dentre as atividades profissionais privativas do Técnico de Administração – art. 2º, alínea “b”, da Lei nº 4769/65), e operações de inter-factoring no comércio internacional de importação e exportação (factoring internacional), o que, por sua vez, mantém íntegra a obrigatoriedade de registro/inscrição da apelada perante o Conselho Regional de Administração de São Paulo, devendo ser reformada, pois, a sentença a quo.

[…]

Diante do exposto, nos termos do art. 932, V do CPC de 2015, dou provimento à apelação, para declarar a manutenção da exigibilidade de inscrição/registro da apelada junto ao Conselho Regional de Administração de São Paulo – CRA/SP e, por sua vez, reconhecer a higidez da sanção (multa) subsequente, tudo, nos termos retro mencionados, em consequência invertendo os ônus de sucumbência fixados na sentença recorrida.

[…] (TRF3 – 6ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5023022-83.2018.4.03.6100, RELATOR: Gab. 18 – DES. FED. SOUZA RIBEIRO, Data de julgamento: 23/09/2021, Data de publicação: 28/09/2021)*.