SENTENÇA
- RELATÓRIO.
Dispensado o relatório.
- FUNDAMENTAÇÃO.
2.1. Da cobrança de anuidades de Conselho de Fiscalização
Profissional.
A Lei nº 12.514/2011 trata das contribuições devidas aos conselhos profissionais em geral.
Destaco alguns dispositivos da referida norma:
Art. 3º As disposições aplicáveis para valores devidos a conselhos profissionais, quando não existir disposição a respeito em lei específica, são as constantes desta Lei. Parágrafo único. Aplica-se esta Lei também aos conselhos profissionais quando lei específica: I – estabelecer a cobrança de valores expressos em moeda ou unidade de referência não mais existente; II – não especificar valores, mas delegar a fixação para o próprio conselho. Art. 4º Os Conselhos cobrarão: I – multas por violação da ética, conforme disposto na legislação; II – anuidades; e III – outras obrigações definidas em lei especial. Art. 5º O fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício. (grifo nosso).
Colaciono ainda a decisão proferida na TR/SE extraída do processo nº 0507293-66.2018.4.05.8500T:
TRIBUTÁRIO. ANUIDADE. ACÓRDÃO IMPUGNADO QUE CONSIDERA FATO GERADOR A INSCRIÇÃO EM CONSELHO PROFISSIONAL. ACÓRDÃO PARADIGMA QUE EXIGE EFETIVO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. INCIDÊNCIA DO ART. 5º DA LEI 12.514/2011, CONVERGENTE COM O ART. 114/CTN. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO IMPROVIDO, COM FIXAÇÃO DE TESE.
VOTO
Pretende-se a reforma de acórdão da Turma Recursal de Sergipe (anexo29) que manteve a cobrança de anuidades de conselho de fiscalização profissional.
A decisão da Presidência desta Turma Regional (anexo 37) sintetizou a controvérsia posta na instância uniformizadora:
“Realizando-se o cotejo analítico, percebe-se que o postulante logrou êxito ao demonstrar o dissídio jurisprudencial.
Na específica hipótese dos autos, a Turma Recursal entendeu que, com o advento da Lei nº 12.514/2011, o fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício (art. 5º, da Lei nº 12.514/2011). Então, concluiu-se que, como período controvertido é referente aos exercícios de 2014 a 2018, é aplicável o tempus regit actum.
Por outro lado, no paradigma invocado, constatou-se que deveria haver a desconstituição da cobrança das anuidades relativas aos exercícios de 2011 a 2014, uma vez que se aplicou o entendimento de que o fato gerador da anuidade devida a Conselho Profissional é o efetivo exercício da atividade, e não apenas o registro na entidade.
Trata-se, portanto, de decisões devidamente fundamentadas juridicamente que, apesar de tratarem de casos com similitude fática e jurídica, mostram-se diametralmente opostas, oriundas de Turmas Recursais da 5ª Região.”
Deveras, há divergência a uniformizar, pois entre o acórdão recorrido e o aresto paradigma há discordância de interpretação sobre a incidência do artigo 5º da Lei 12.514/2011.
Realmente, o acórdão recorrido, mencionando expressamente o dispositivo legal, negou a qualidade de segurado. É trecho do pronunciamento:
“’Narra o(a) autor(a) que, após conclusão do Curso Técnico em radiologia, requereu, ao Conselho Regional de Técnicos em Radiologia – CRTR – 7ª Região, sua inscrição, no entanto, nunca chegou a obter resposta, bem como nunca chegou a exercer a dita profissão e que vem laborando em outras funções, sem relação com o curso técnico em radiologia.
Prossegue o(a) demandante noticiando que recebeu notificação extrajudicial do CRTR-7ª Região, para que efetuasse a quitação das anuidades referentes aos anos de 2014 a 2018, num montante total de R$ 2.091,86 (dois mil, noventa e um reais e oitenta e seis centavos) junto aos respectivo conselho, sob pena de inscrição em dívida ativa.’
(…)
O recurso não merece acolhida.
Com efeito, desde o advento da Lei nº 12.514/2011, que trata das ‘contribuições devidas aos conselhos profissionais em geral’, o fato gerador das anuidades é ‘a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício’, conforme prescrito em seu artigo 5º. Note-se que todas as anuidades aqui controvertidas são posteriores a tal marco regulatório, de modo que aplicável o tempus regit actum.
Dessa forma, até quando formulado o requerimento de cancelamento da inscrição previamente requerida (anexo 3) e, sempre tendo em mente o prazo prescricional, a cobrança das anuidades ulteriores à vigência da Lei nº 12.514/2011 é lícita.
Ademais, diferentemente do alegado pela demandante em sua peça inicial, a ré comprovou que em 31/01/2013 informou a autora sobre o deferimento do seu requerimento de inscrição (anexo 16).” (Destacado)
O acórdão paradigma (anexo 33) teve interpretação diversa acerca do fato gerador da obrigação tributária:
“5. O registro gera presunção relativa de que o profissional exerce a atividade fiscalizada pelo conselho respectivo, e, por isso, pode ser afastada mediante comprovação de que a função não foi desempenhada.
- Restou comprovado nos autos que o autor mudou de ramo de atuação, exercendo atividade não privativa de administrador, conforme o contrato social de 05/03/2010 e CTPS, onde consta anotação de 01/11/2010 a 08/04/2014, como diretor administrativo de empresa privada (anexo 24).
- Assim, concluise que o autor não exerce atividades inerentes ou privativas do profissional de Administração (Administrador ou Tecnólogo), previstas no art. 2º, da Lei 4.769/65.
- Dessa forma, tendo em vista que as anuidades cobradas pelo CRA/RN são referentes aos anos de 2011 a 2014 (tendo havido a remissão das parcelas anteriores), exercícios em que o autor já exercia atividade não privativa de administrador, deve ser mantida a sentença de procedência.”
O entendimento paradigma deve prevalecer.
O acórdão recorrido, em realidade, nega vigência ao artigo 5º da Lei 12.514/2011:
“O fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício.”
Ora, a definição legal do fato gerador não inclui o efetivo exercício da profissão, sendo bastante a inscrição. Não há, portanto, ofensa ao art. 114 do CTN:
“Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.”
Ante o exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO ao incidente, com fixação da seguinte tese: “O fato gerador da anuidade ocorre com a inscrição no conselho de fiscalização profissional, conforme art. 5º da Lei 12.514/2011”.
2.2. Do Dano Moral.
Acerca do dever do Estado de reparar danos causados por ato de seus agentes, há de ser trazida a lume a dicção do artigo 37, § 6º da Constituição Federal, verbis:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(…)
- 6º – As pessoas jurídicas de serviços de direito público e as de direito privado prestadoras públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
A responsabilidade civil extracontratual demanda a existência dos seguintes elementos: conduta ilícita dolosa ou culposa do agente, dano e nexo causal entre esse dano e a conduta praticada (CC, arts. 186 e 927).
Por sua vez, a responsabilidade civil do Estado, tal como delineada no art. 37, § 6º, da Constituição da República, não reclama a prova de culpa ou dolo, bastando a conduta do estado (ente público), o dano legítimo e o nexo causal. Parte da doutrina considera que o dispositivo, fundamentado na Teoria do Risco Integral, abrange não só a ação danosa do Estado, mas também os casos de omissão estatal, quando decorrente da violação de um dever legal específico (omissão específica); outra porção da doutrina e jurisprudência considera a responsabilidade por omissão estatal de caráter subjetivo, calcada na Teoria da Culpa Administrativa, a exigir a prova de falha na prestação de um serviço (ausência do serviço, serviço defeituoso ou serviço demorado).
Ademais, na ausência de algum dos sobreditos requisitos ou na presença de causa de exclusão ou atenuação, a responsabilidade estatal restará afastada ou minorada.
No que concerne ao dano moral, este é consagrado no artigo 5º, X da Carta Constitucional, in verbis:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…) X – são invioláveis à intimidade, à vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
Trago lição doutrinária de Pablo Stolze Glagliano:
Dano moral é aquele que lesiona a esfera personalíssima da pessoa (seus direitos da personalidade), violando, por exemplo, sua intimidade, vida privada, honra e imagem, bens jurídicos tutelados constitucionalmente” (Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil, 4ª ed., Saraiva, p. 55).
E, mais, segundo o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves, dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, intimidade, a imagem, o bom nome, etc., como se infere dos art. 1º, III, e 5º, V e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. v. IV).
Trago julgados:
ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. CONSELHO REGIONAL DE ODONTOLOGIA. REGISTRO. AUXILIAR EM SAÚDE BUCAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. DEMORA NA EMISSÃO DE CARTEIRA PROFISSIONAL. INJUSTIFICADA. PERDA DE FUNÇÃO EM UNIDADE HOSPITALAR. REPARAÇÃO POR DANO MORAL. CABIMENTO. (6) 1. O cerne da questão cinge-se em reconhecer o direito da parte autora em ser indenizada por danos morais, em razão da demora do procedimento de registro, inscrição e emissão da carteira profissional junto ao Conselho Regional de Odontologia – CRO e do Conselho Federal de Odontologia – CFO, sem justificativas plausíveis, resultando em perda de função pela parte autora em unidade hospitalar. 2. O teor do art. 37, §6º, da Constituição Federal dispõe que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviço público responderão pelos danos que seus agentes causarem a terceiros.3. Os Conselhos profissionais em razão de possuírem natureza jurídica de autarquias tem responsabilidade objetiva pelos danos causados, sendo suficiente a evidência da ação ou omissão, nexo causal e resultado, independente da aferição de elemento subjetivo de dolo ou culpa. 4. Configurado o ato ilícito por omissão, o Conselho profissional afigura-se o causador do dano e fica obrigado a repará[1]lo nos termos dos artigos 186, 187 e 927 do Novo Código Civil, em razão da violação ao direito da autora em ter emitida a carteira profissional. (…) 6. “Na fixação de indenização por danos morais, são levadas em consideração as peculiaridades da causa. Nessas circunstâncias, considerando a gravidade do ato, o potencial econômico do ofensor, o caráter pedagógico da indenização e os parâmetros adotados em casos semelhantes (…)”(AgRg no AREsp 630.604/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 17/03/2015, DJe 14/04/2015). 7. Conforme entendimento desta Corte e do STJ, razoável a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 6.000,00 (cinco mil reais), tendo em vista não se tratar de valor excessivo ou irrisório e se prestar à justa indenização do autor pelos danos morais sofridos. 8. Apelação não provida. (TRF da 1ª Região, Apelação Cível nº 00053539820114014000, 7ª Turma, rel. Des. Federal Ângela Catão, e[1]DJF1 DATA:17/11/2017).
ADMINISTRATIVO. CREA. CONFEA. CURSO SEQUENCIAL. NÃO HOMOLOGAÇÃO. RESOLUÇÃO 448/2000. NECESSIDADE DE REPARAÇÃO. DANO MORAL. IMPROVIMENTO DOS RECURSOS. 1. A questão se refere à condenação do CREA/RJ a conceder ao autor o registro profissional, a fim de que possa exercer regularmente a profissão de Gestor de Obras Civis, em nível de tecnólogo, bem como a condenação solidária do CREA/RJ e do CONFEA ao pagamento de indenização por danos morais. (…) 6. As resoluções supervenientes foram indevidamente aplicadas. Caracterizado o dano moral, pois a demora da inscrição profissional indica não apenas aborrecimento e desconforto, mas prejuízo ao apelante, em verdadeiro sofrimento psicológico, maior que mero dissabor ou incômodo, merecedor de uma efetiva reparação. 7. Analisando o quantum da indenização fixada pela sentença, verifica-se que o valor de R$ 30.000,00 (cinco mil reais) é razoável e adequado a compensar os danos morais experimentados. 1 8. Recursos improvidos. (TRF da 2ª Região, Apelação Cível/Reexame Necessário nº 00133469720104025101, 6ª Turma Especializada, rel. Des. Federal Salete Maccalóz, Publicado em 29/03/2016)
2.3. Do caso concreto.
Narra o(a) autor(a) que, apesar de não ter efetuado, pessoalmente, a sua inscrição perante a parte Ré, descobriu que o seu nome foi protestado em Cartório, referente à cobrança de anuidade do ano de 2018.
Relata a autora que, embora a sua inscrição perante o Conselho Regional de Administração de Sergipe – CRA/SE tenha ocorrido em 1991, desde 04/02/1992 tomou posse em cargo público, incompatível com o exercício da profissão de administrador, razão pela qual, em momento anterior a referida data, teria requerido o cancelamento de sua inscrição.
Informa ainda a parte autora que, após tomar conhecimento do protesto efetuado, entrou em contato, via e-mail, com o Conselho Regional de Administração de Sergipe – CRA/SE, requerendo a declaração de inexistência de dívida, bem como o cancelamento de sua inscrição, no entanto, referido pleito foi indeferido.
Dessa forma, promove esta ação especial cível com objetivo de declarar a inexistência de débito junto ao CRA/SE, relativo ao débito no valor de R$ 621,55, bem como o cancelamento de sua inscrição perante o Réu, além da indenização pelos danos morais sofridos.
Em defesa (anexo nº 20), o(a) acionado(a), Conselho Regional de Administração de Sergipe – CRA/SE, sem suscitar preliminares ou objeções, rechaça a pretensão autoral.
Inicialmente observo que o documento de anexo 26 comprova que a inscrição da parte autora perante o Conselho Regional de Administração de Sergipe – CRA/SE, ocorreu de forma regular.
O documento de anexo 27 também demonstra que a parte autora já havia sido notificada em relação à existência de débitos.
Por outro ângulo, ao compulsar os autos, verifico que a autora não comprovou que requereu o cancelamento de sua inscrição em momento anterior à sua posse em cargo público, ocorrida, segundo a requerente, em 04/02/1992.
Esclareço ainda que as solicitações de cancelamento, ocorridas a partir de 2020, via e-mail, não foram efetuadas de maneira formal, inclusive com demonstração do pagamento da taxa de cancelamento e apresentação de demais documentos exigidos.
Desta forma, concluo que o protesto de anexo 04, referente à anuidade de 2018, ocorreu de forma regular, afinal, não foi demonstrado nos autos a feitura de qualquer pedido de cancelamento de inscrição em data anterior.
Assim, diante da legalidade que embasa a cobrança de anuidade das mais diversas categorias profissionais, não restando comprovado nos autos o pedido de cancelamento da inscrição junto ao CRA/SE em data anterior à posse em cargo público, ou a feitura regular/formal de ato de cancelamento, conclui-se pelo não cometimento de conduta ilícita por parte do CRA/SE.
Posto isso, como o fato gerador da anuidade aqui cobrada pela requerida é a simples existência de inscrição no conselho, pouco importando o exercício efetivo da atividade profissional, conforme art. 5º da Lei 12.514/2011, entendo que não merecem prosperar os pleitos autorais.
- DISPOSITIVO.
3.1. Por todo o exposto, com fulcro no artigo 487, I, do CPC, EXTINGO o feito, com resolução do mérito, para JULGAR improcedente a demanda.
3.2. Registre-se e Intimem-se, observadas as disposições da Lei nº 10.259/2001.
3.3. Havendo recurso, promova a secretaria a intimação da parte recorrida para apresentar contrarrazões, encaminhando posteriormente os autos à Turma Recursal, tudo independentemente de novo despacho.
3.4. Após a certificação do trânsito em julgado, dê-se baixa e arquive[1]se.
3.6. Intimem-se.
[…]. (TRF5 – 5ª Vara SJ/SE – Nº 0504776-83.2021.4.05.8500S, juiz federal Francisco Guerrera Neto, julgado em: 06/02/2023)