SENTENÇA. OBJETIVANDO INEXIGIBILIDADE DE REGISTRO NO CONSELHO. GERENTE DE AGÊNCIA. FUNÇÕES EXERCIDAS SE ENQUADRAM NAS ATIVIDADES TÍPICAS DOS ADMINISTRADORES. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE.

S E N T E N Ç A

FRANCISCO USERO SANCHEZ ingressou com ação em face do CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO DO MATO GROSSO DO SUL, em que pretende a declaração de inexistência de relação jurídica com indenização de danos morais.

Dispensado o relatório, nos termos do art. 38, da Lei n. 9.099/1995, c/c art. 1º, da Lei n. 10.259/2001, passo ao julgamento do feito.

Os Conselhos Regionais de Fiscalização Profissional são entidades que exercem o poder de polícia, no que tange à fiscalização do exercício da profissão, poder esse que lhes é delegado pela União, ente federativo com competência para legislar sobre as condições para o exercício profissional (artigo 22, XVI, Constituição Federal).

A lei 6.839/80 tem como objetivo principal estabelecer a obrigatoriedade do registro de empresas e profissionais legalmente habilitados nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões. Em outras palavras, a mencionada lei visa regulamentar e garantir a fiscalização das atividades profissionais, garantindo que apenas indivíduos devidamente habilitados exerçam determinadas atividades.

Nos termos do disposto no art. 1º, da lei 6.839/80, o critério que define a obrigatoriedade do registro das empresas perante os Conselhos de Fiscalização profissional é a atividade básica (fim) desenvolvida ou a natureza dos serviços prestados a terceiros.  

Por outro lado, o exercício da profissão administrador está previsto na lei 4.769/65, que dispõe, em seu art. 2º, as atividades características desta profissão:  

“Art. 2º A atividade profissional de técnico de administração será exercida, como profissão liberal ou não, mediante:  

Pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;  

Pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos da Administração, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que esses se desdobrem ou aos quais sejam conexos”. 

O Decreto 61.934/67, que regulamenta a Lei 4.769/65, dispõe no art. 3º sobre a atividade profissional do administrador: 

“Art 3º A atividade profissional do Técnico de Administração, como profissão, liberal ou não, compreende:  

Elaboração de pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens e laudos, em que se exija a aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de organização;  

Pesquisas, estudos, análises, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos de administração geral, como administração e seleção de pessoal, organização, análise métodos e programas de trabalho, orçamento, administração de matéria e financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais bem como outros campos em que estes se desdobrem ou com os quais sejam conexos;  

O exercício de funções e cargos de Técnicos de Administração do Serviço Público Federal, Estadual, Municipal, autárquico, Sociedades de Economia Mista, empresas estatais, paraestatais e privadas, em que fique expresso e declarado o título do cargo abrangido;  

O exercício de funções de chefia ou direção, intermediaria ou superior assessoramento e consultoria em órgãos, ou seus compartimentos, de Administração Pública ou de entidades privadas, cujas atribuições envolvam principalmente, aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de administração;  

O magistério em matéria técnicas do campo da administração e organização”.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de que, em se tratando de empresa, o parâmetro para saber se há, ou não, necessidade de registro no conselho profissional é o objeto da pessoa jurídica, aliado à plena correspondência das suas atividades com o rol das competências do órgão de fiscalização profissional. 

A necessidade de inscrição no Conselho Regional de Administração (CRA) para gerentes depende da atividade principal da empresa e do cargo exercido pelo gerente. Se a empresa tem como atividade-fim a administração ou presta serviços na área, a inscrição é obrigatória para os profissionais responsáveis por essas atividades, incluindo gerentes. No entanto, se a empresa atua em outros setores e a função de gerente é mais uma atividade meio, a inscrição pode não ser necessária. 

Por sua vez, o dever de indenizar em razão de danos morais decorre do preceito contido no art. 5º, X, da Constituição da República, que, inclusive, considera inviolável a honra das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Sendo vulnerado direito da personalidade, o art. 12, do Código Civil, admite reclamação das perdas e danos.  Havendo violação a direito que cause dano moral, é cabível a indenização, conforme leitura dos artigos 186 e 187, c/c 927, todos daquele mesmo diploma.

Aqui, independe de prova objetiva do abalo moral sofrido, mesmo porque é praticamente impossível provar fatos inerentes à introspecção do indivíduo.  O dano moral, dada a sua natureza incorpórea, não requer prova, bastando a demonstração do fato ensejador do dano.  Uma vez comprovado o fato que afetou a honra objetiva (reputação perante a sociedade ou grupo) ou a honra subjetiva (apreço que o indivíduo tem por si mesmo), estará caracterizado o dever de compensação por parte do causador da lesão.  

Portanto, basta a demonstração objetiva do fato que ensejou o dano extrapatrimonial, este consubstanciado na dor, no sofrimento, nos sentimentos íntimos de constrangimento, vergonha e de desvalimento.

No caso em concreto: “O autor é graduado em Administração e possui registro professional no Conselho Regional de Administração sob o n° 2084, registrado em 21/08/2002. No entanto, o requerente não exerce e nunca exerceu atividades privativas da profissão de Administrador. Atualmente, o Requerente atua como GERENTE DE AGÊNCIA na cooperativa de crédito rural CREDICOAMO, exercendo atividades inerentes à função de gestão financeira e comercial, conforme previsto na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) sob o código 1417-10. Todavia, a atividade profissional que exerce não exige a referida filiação e, como o Autor nunca utilizou o CRA, percebeu que estava tendo gastos com anuidade sem necessidade. Em 04/11/2022 o Requerente protocolou junto ao Conselho Regional de Administração pedido de cancelamento de seu registro professional, alegando que não existe atividades privativas da profissão e que a manutenção de seu registro lhe causa ônus desnecessários. Contudo, em 16/02/2023, o Conselho Regional de Administração indeferiu o pedido de cancelamento do registro, fundamentando sua decisão na CBO 1417-10 e no art. 2° da Lei 4.769/65, conforme documento em anexo. O Conselho argumentou que a função de Gerente de Agência, mesmo em uma cooperativa de crédito, se enquadra nas atividades privativas de Administração, exigindo, portanto, o registro profissional. E, desde então, vem tentando resolver a questão administrativamente, porém, sem sucesso. O Autor nunca usou a carteira e nem exerceu a profissão de administrador. Em 2017 entrou na COOPERATIVA DE CRÉDITO RURAL – CREDICOAMO, conforme CTPS em anexo. Exerce o cargo de Gerente de Agência, e não é pré-requisito ser ADMINISTRADOR. A propósito, para ser incluído no cargo em questão, não foi exigido do Autor o registro junto ao CRA, dado que NÃO SE TRATA DE ATIVIDADE EXCLUSIVA DE ADMINISTRADOR. Note, outros ocupantes de mesmo cargo não foram compelidos a filiar- se ao referido Conselho, uma vez que muitos nem possuem formação em Administração, e sim em outras áreas de atuação, sendo impossível tal filiação”.

Em contestação, o Conselho Regional assevera que a atividade do autor (gerente) está enquadrada na atividade profissional de Técnico de Administração (artigo 2º, Lei 4.769/1965).

Consta que o autor, gerente em cooperativa, enviou requerimento, datado de 04/11/2022, requerendo seu cancelamento do registro profissional (ID 352005911). Em decisão, o requerido indeferiu o “pedido de cancelamento, devido a comprovação de atuação em área da Administração” (ID 352005922).

A descrição sumária do “CBO 1417-10 – Gerente de Agência” confirma que cabe a esse profissional:

1. Comercializam produtos e serviços financeiros; implementam processos operacionais;

2. Planejam processos de operações bancárias; coordenam o desenvolvimento e a implantação de produtos, serviços e processos; gerenciam pessoas; traçam plano diretor para áreas de crédito, produtos e comercialização;

3. administram recursos materiais, financeiros e serviços de terceiros; comunicam-se, oralmente e por escrito, divulgando e consolidando informações, normas e procedimentos, campanhas de vendas, interagindo com pessoas e conduzindo reuniões.

No caso a atividade de gerência em cooperativa exerce atividades típicas de administrador, eis que segundo o artigo 2º, alínea b, da Lei 4.769/1965, a atividade profissional de técnico de administração será exercida mediante “organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira”, estas vinculadas ao cargo de gerente.

Dessa forma, entendo que o autor está sujeito à fiscalização do Conselho Regional de Administração, eis que exerce atividades típicas de técnico de administração.

Lei 4.769/1965

Art 2º A atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, VETADO, mediante:

a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;

b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e contrôle dos trabalhos nos campos da administração VETADO, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que êsses se desdobrem ou aos quais sejam conexos;

Ante o exposto e por tudo mais que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, resolvendo o mérito com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

[…]

(TRF3- PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL  Nº 5000329-46.2025.4.03.6202. DINAMENE NASCIMENTO NUNES, julgado em: 01/07/2025)