SENTENÇA. OBJETIVANDO INEXIGIBILIDADE DE ANUIDADES. EXCLUSÃO DO NOME DA AUTORA DOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO.  INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS POR COBRANÇA INDEVIDA. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE.

S E N T E N Ç A

Trata-se de ação sob o procedimento comum ajuizado por NATALIA DE PAULA VARGAS SAURO em face do CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRACAO DE SAO PAULO – CRA-SP, objetivando, em sede liminar, que o seu nome seja imediatamente retirado do cadastro de negativados e que a autarquia ré se abstenha de realizar quaisquer cobranças de anuidades vencidas de 2021 em diante, sob pena de multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais) por descumprimento.

No mérito, requer o cancelamento definitivo de qualquer inscrição havida em nome da autora perante a autarquia requerida, bem como seja declarado inexistente o débito, condenando-se o réu a restituir à autora o valor pago (R$ 118,86), devidamente corrigido, e ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de danos morais.

Relata a autora que em 2009, último ano do curso de Administração, um representante do CRA-SP foi à faculdade para apresentar o Conselho aos estudantes.

Sustenta que o representante do CRA-SP informou que o registro era obrigatório e argumentou que todos os estudantes do curso deveriam efetuar, naquele momento, um registro provisório e que o registro definitivo somente se daria após a conclusão da graduação, mediante a apresentação do Certificado de Conclusão do Curso e Diploma junto ao órgão.

Alega que, ludibriada pelas informações repassadas pelo representante do Conselho, a autora e seus demais colegas de turma realizaram o registro provisório perante o órgão.

Esclarece que, após sua formatura, foi trabalhar em ramo diverso do curso em que havia graduado, razão pela qual não mais se preocupou com nada relacionado ao Conselho, eis que não exerceria qualquer função relacionada à Administração. Ademais, como só tinha realizado o registro provisório no CRASP, acreditou que não estava mais vinculada ao órgão.

Contudo, assevera que, em 2010, recebeu um boleto emitido pelo CRA-SP concernente à suposta anuidade que teria de adimplir por estar vinculada ao Conselho. Na ocasião, compareceu a uma Delegacia do órgão sendo informada que bastaria apenas pagar uma taxa de R$ 50,00 (cinquenta reais) e preencher uma solicitação de cancelamento do registro provisório, que a situação estaria resolvida, inclusive não mais estaria vinculada ao órgão. Na oportunidade, além de pagar a taxa, ainda teve de arcar com a anuidade do ano de 2010, já que foi informada que deveria estar em dia com as obrigações para se desfiliar do órgão.

Afirma que tomou conhecimento de que seu nome havia sido negativado pelo CRA-SP por suposto inadimplemento das anuidades do conselho dos anos de 2016 a 2020.

Irresignada com a situação, a autora até chegou a efetivar o pagamento de um boleto emitido pelo réu concernente à anuidade proporcional do ano de 2021 (3/12avos), objetivando se desfiliar do conselho. No entanto, tal pagamento de nada adiantou, já que, para que seu nome não fosse negativado e o cancelamento da inscrição fosse realizado, o representante do CRA-SP esclareceu que o termo de confissão de dívida proposto deveria ser aceito pela autora.

Assim, acreditando não ser devidos os valores cobrados, já tendo pago a anuidade proporcional de 2021 de maneira descabida, a autora não deu seguimento às tratativas e não concordou com o acordo proposto.

Sustenta que, na tentativa de proceder, mais uma vez, ao cancelamento definitivo de seu registro perante o réu, a autora esbarrou em exigências no sentido de que somente após a quitação das anuidades tal descadastramento poderá ser efetivado, exigência que não tem expressa de previsão legal. 

Ao final, requer seja declarado inexistente o débito da autora perante a autarquia ré; que seja a requerida condenada a restituir à autora o valor pago relativo à anuidade proporcional do ano de 2021, qual seja, R$ 118,86 (cento e dezoito reais e oitenta e seis centavos), devidamente corrigido; que seja determinado, em definitivo, o cancelamento formal de qualquer inscrição havida em nome da autora perante a autarquia requerida; e a condenação da autarquia ré na quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de danos morais pela negativação indevida do nome da autora, com a incidência de juros de mora desde a data do evento danoso e correção monetária, desde a data do arbitramento.

Atribuiu-se à causa o valor de R$ 13.263,63 (treze mil duzentos e sessenta e três reais e sessenta e três centavos).

Inicial acompanhada de procuração e documentos.

pedido de tutela de urgência foi indeferido, ante a ausência da probabilidade do direito (ID 240159385).

Em face da r. decisão foi interposto agravo de instrumento, que restou improvido.

Citado, o CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRACAO DE SAO PAULO – CRA-SP apresentou contestação (ID 245166715). Preliminarmente, impugna o valor da causa, uma vez que não existe quantificação no que tange ao dano moral e, portanto, o valor é totalmente descabido, sobretudo porque a tabela de dano moral do STJ estipula valores estimados de R$ 5.000,00 (Cinco mil reais). Requer a diminuição do valor da causa para R$ 5.000,00 (Cinco mil reais) ou outro valor condizente ao processo que o r. Juízo decidir.

No mérito, requer a improcedência da ação. Defende que se equivoca a Autora, ao argumentar que não cabe aos conselhos de fiscalização profissional compelir, arbitrariamente, a parte a ele se vincular, sob pena de violação aos princípios do livre exercício profissional e da liberdade de associação.

Assevera que cabe ao conselho, o CRA – SP, fiscalizar empresas e escritórios que, possivelmente, estão exercendo atividades típicas do Administrador, constantes na Lei nº 4.769/65, notadamente em seu artigo 15.

Sustenta que a Autora, formada em Administração de Empresas, como dito na exordial, ao requerer a sua inscrição/registro neste Conselho, tinha plena ciência de que estava se registrando no órgão responsável pela fiscalização do exercício profissional do Administrador, de maneira que, conforme dispõe o artigo 3.° da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, “ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.

Houve apresentação da Réplica(ID 247880423)

Intimadas sobre a produção de provas, as partes não demonstraram interesse em produzir mais provas.

Com a informação de trânsito em julgado do agravo de instrumento interposto aos 23.05.2023, vieram os autos à conclusão.

É o relatório. Passo a decidir.

As partes são legítimas e estão bem representadas. Presentes os pressupostos de formação e desenvolvimento válido e regular da relação processual, o feito se encontra em termos para julgamento.

Inicialmente, afasto a impugnação ao valor da causa. Tratando-se a ação com pedido de danos morais, o valor atribuído à causa deverá ser fixado em consonância com o total pretendido a título de indenização. Tendo a autora assim procedido, a impugnação ao valor da causa deve ser rechaçada.

Passo ao exame do mérito.

A legislação – Lei nº 6839/80 – responsável pelo registro de empresas nas entidades fiscalizadoras do exercício de profissões, dispõe, em seu artigo 1º, que o registro será obrigatório nas respectivas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros.

Por seu turno, o art. 3º do Decreto nº 61.934/67 e art. 2º da Lei nº 4769/65, dispõem, em síntese, sobre o exercício da profissão de Técnico de Administração e outras providências, e especificam, de forma taxativa, as atividades de competência do aludido profissional, a saber:

“Art 3º – A atividade profissional do Técnico de Administração, como profissão, liberal ou não, compreende:

a) elaboração de pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens e laudos, em que se exija a aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de organização;

b) pesquisas, estudos, análises, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos de administração geral, como administração e seleção de pessoal, organização, análise métodos e programas de trabalho, orçamento, administração de matéria e financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais bem como outros campos em que estes se desdobrem ou com os quais sejam conexos;

c) o exercício de funções e cargos de Técnicos de Administração do Serviço Público Federal, Estadual, Municipal, autárquico, Sociedades de Economia Mista, empresas estatais, paraestatais e privadas, em que fique expresso e declarado o título do cargo abrangido;

d) o exercício de funções de chefia ou direção, intermediaria ou superior assessoramento e consultoria em órgãos, ou seus compartimentos, de Administração Pública ou de entidades privadas, cujas atribuições envolvam principalmente, aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de administração;

c) o magistério em matéria técnicas do campo da administração e organização.

Art 2º A atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, VETADO, mediante:

a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;

b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos da administração VETADO, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que esses se desdobrem ou aos quais sejam conexos (…)”

Compulsando os autos, verifica-se que a autora realizou registro provisório no Conselho quando cursava o último ano de administração e, que após a formatura, como foi trabalhar em área diversa do curso realizado e que, como o “representante do CRASP havia dito, quando do registro provisório que, para o registro definitivo seria necessário a entrega ao conselho do seu Diploma e Certificado de Conclusão da Administração, entendeu que não estava mais ligada ao CRASP.”

No que tange à matéria discutida, encontra-se consolidada a jurisprudência no sentido de que o vínculo com o órgão de fiscalização profissional estabelece-se pelo mero registro no respectivo quadro.

Assim, uma vez inscrito no conselho, o profissional é obrigado a recolher as anuidades, sendo necessário o pedido de cancelamento de sua inscrição junto ao órgão para eximir-se de tal responsabilidade.

Portanto, constitui ônus do profissional requerer o cancelamento de sua inscrição perante o conselho de classe e, sem o cumprimento dessa formalidade, é devido o pagamento das anuidades. Apesar da parte autora alegar que requereu o cancelamento/baixa de seu registro perante o conselho em 2010, não há comprovação do alegado. Assim, para que haja o reconhecimento de que são indevidas as anuidades a parte autora deve comprovar o requerimento do cancelamento, o que não ocorreu no presente caso.

Somente seria indevida a cobrança de anuidades após o pedido de cancelamento.

Na mesma linha de entendimento, colaciono julgado do E. Tribunal Regional Federal da 3ª. Região:

“ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. INSCRIÇÃO. PEDIDO DE CANCELAMENTO. APELAÇÃO DESPROVIDA. 

1. A questão devolvida a esta E. Corte diz respeito à obrigatoriedade de inscrição junto ao Conselho Regional de Administração do Estado de São Paulo – CRA/SP, bem como ao pagamento da anuidade referente ao exercício de 2014. 

2. A Lei nº 4.769/65 dispõe, em seu art. 2º, que “a atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, mediante: a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior; b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e contrôle dos trabalhos nos campos da Administração, como Administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, Administração de material, Administração financeira, relações públicas, Administração mercadológica, Administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que esses se desdobrem ou aos quais sejam conexos”. 

3. Os arts. 14 e 15 da mesma lei determinam que “só poderão exercer a profissão de Técnico de Administração os profissionais devidamente registrados nos C.R.T.A., pelos quais será expedida a carteira profissional”, e que “serão obrigatoriamente registrados nos C.R.T.A. as empresas, entidades e escritórios técnicos que explorem, sob qualquer forma, atividades do Técnico de Administração, enunciadas nos termos desta Lei”. O art. 1º, Parágrafo Único, da Lei nº 7.321/85, alterou para “Administrador” a denominação da categoria profissional de “Técnico de Administração”. 

4. Como bem asseverado pelo Magistrado a quo, não cabe no bojo desta ação analisar se as atividades desenvolvidas pelo apelado enquadram-se nas acima listadas como privativas de administrador para mantê-lo compulsoriamente inscrito, pois o Conselho possui meios diversos, legalmente previstos, para punir eventual exercício ilegal da profissão. 

5. Nesse sentido, é incontroverso que o autor requereu o cancelamento da sua inscrição em 22/02/2013, de modo que devem ser devolvidos os valores pagos a título de anuidade desde então. 

6. Apelação desprovida.” (grifo nosso)

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv – APELAÇÃO CÍVEL – 5008094-93.2019.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 06/03/2020, e – DJF3 Judicial 1 DATA: 10/03/2020) 

Não havendo ilegalidade na cobrança, incabível a análise e fixação de indenização por danos morais, tampouco a devolução do valor pago, a inexigibilidade das anuidades dos anos de 2016 a 2020 ou o cancelamento da inscrição.

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE A AÇÃO extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015.

[…]

(TRF3- 4ª Vara Cível Federal de São Paulo, PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5037216-83.2021.4.03.6100, Juíza Federal Raquel Fernandez Perrini, julgado em 25/11/2023)