EMENTA: CONSTITUCIONAL. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ALCANCE

EMENTA: CONSTITUCIONAL. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ALCANCE. 1 – Com efeito, o desempenho das atividades administrativas é reservado aos Administradores, consoante delineado na Lei nº 4.769/65, apesar da edição da Portaria 2.225/GM, eis que a aludida Portaria jamais poderá alterar ou dispor sobre os requisitos previstos em lei. – A propósito do poder regulamentar, é sempre atual o magistério de Pimenta Bueno, o mais autorizado intérprete da Carta Imperial de 1824, que o considera abusivo nos seguintes casos, verbis: “1º) em criar direitos, ou obrigações novas, não estabelecidas pela lei, porquanto seria uma inovação exorbitante de suas atribuições, uma usurpação do poder legislativo, que só poderá ser tolerada por câmaras desmoralizadas. Se assim não fora poderia o governo criar impostos, penas, ou deveres, que a lei não estabeleceu, teríamos dois legisladores, e o sistema constitucional seria uma verdadeira ilusão; 2º) em ampliar, restringir ou modificar direitos ou obrigações, porquanto a faculdade lhe foi dada para que fizesse observar fielmente a lei, e não para introduzir mudança ou alteração alguma nela, para manter os direitos e obrigações como foram estabelecidos, e não para acrescentá-los ou diminuí-los, para obedecer ao legislador, e não para sobrepor-se a ele; 3º) em ordenar, ou proibir o que ela não ordena, ou não proíbe, porquanto dar-se-ia abuso igual ao que já notamos no antecedente número primeiro. E demais, o governo não tem autoridade alguma para suprir, por meio regulamentar, as lacunas da lei, e mormente do direito privado, pois que estas entidades não são simples detalhes, ou meios de execução. Se a matéria como princípio é objeto de lei, deve ser reservada ao legislador; se não é, então não há lacuna na lei, sim objeto de detalhe de execução; 4º) em facultar, ou proibir, diversamente do que a lei estabelece, porquanto deixaria esta de ser qual fora decretada, passaria a ser diferente, quando a obrigação do governo é de ser em tudo e por tudo fiel e submisso à lei; 5º) finalmente, em extinguir ou anular direitos ou obrigações, pois que um tal ato equivaleria à revogação da lei que os estabelecera ou reconhecera; seria um ato verdadeiramente atentatório.: (In Direito Público Brasileiro e Análise da Constituição do Império, Rio de Janeiro, 1857, p. 237, nº 326: – E mais adiante, conclui o ilustre Mestre, verbis: – “O governo não deve por título algum falsear a divisão dos poderes políticos, exceder suas próprias atribuições, ou usurpar o poder legislativo. – Toda e qualquer irrupção fora destes limites é fatal, tanto às liberdades públicas, como ao próprio poder.” (In Op. Cit., p. 237: – Realmente, o ordenamento jurídico brasileiro atribui ao regulamento unicamente o papel de regulamentar a lei, esclarecendo o seu comando normativo, porém, sempre, observando-a, estritamente, não podendo inovar, ampliar ou restringir direitos, sob pena de ilegalidade. – Nesse sentido, orienta-se a melhor doutrina, verbis: – “748. – Le règlement de police, parce qu’il est un règlement, est hiérarchiquement inférieur à la loi. Il ne peut aller, dans ses dispositions, à l’ encontre des prescriptions législatives, s’il en existe sur tel ou tel point perticulier. (PAUL DUEZ et GUY DEBEYRE, in Traité de Droit Administratif, Librairie Dalloz, Paris, 1952, p. 514: LES LIMITES DU POUVOIR RÉGLEMENTAIRE – Elles sont toutes l’expression de la subordination de l’ autorité règlementaire au législateur. Ont peut les classer ainsi: – 1º Obligation de respecter les lois dans leur lettre et dans leur esprit; – 2º Impossibilité d’interpréter la loi: ce pouvoir n’appartient qu’au législateur et aux tribunnaux: CE ( Sect.), 10 juin 1949, Baudouin. – 3º Impossibilité pour l’autorité administrative de prende l’initiative de diminuer par um règlement la liberté des citoyens si le législateur n’a pas posé au mains le principe d’une telle limitation; (…).: (MARCEL WALINE, in Traité Élémentaire de Droit Administratif, 6ª ed., Libr. Du Recueil Sirey, Paris, 1952, p. 41: – Essa é, igualmente, a jurisprudência da Suprema Corte, verbis: – “Resolução n.º 194/1970 do CONFEA – Exercício da Profissão de Engenharia, Agronomia e Arquitetura – Exigências ilegais. Dada a inferioridade constitucional do regulamento em confronto com a lei, é evidente que aquele não pode alterar, seja ampliando, quer restringindo, os direitos e obrigações prescritos nesta. (…).: (RE n.º 81.532-BA, rel. Min. CUNHA PEIXOTO, in RTJ 81/494). 2 – Improvimento da apelação. (TRF4, AC 2003.71.03.001260-5, TERCEIRA TURMA, Relator CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Data Julgamento 07/12/2005).

Trânsito em Julgado em: 28/07/2011.

“VOTO […]
Também não prospera a tese da autora de que não estaria sujeita à aplicação da penalidade porque a Lei n° 4.769/65 diz respeito apenas aos Administradores da iniciativa privada, enquanto ela ocupava cargo em instituição hospitalar que estava sob intervenção da Prefeitura Municipal de Uruguaiana/RS.
Isso se justifica na medida em que o art. 4° da Lei n° 4.769/65 é expresso ao estabelecer que as atividades ali discriminadas são privativas de Administradores, tanto na iniciativa privada, quanto em órgãos públicos. Portanto, também na Administração Pública é imperiosa a presença de Administradores, não servindo o argumento relativo à intervenção municipal para justificar a situação. Ainda atacando o auto de infração lavrado em seu desfavor, a autora, bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, refere que à época dos fatos estava adequada ao disposto na Portaria n° 2.225/GM, do Ministério da Saúde, a qual prevê que o responsável pela Direção Administrativa de entidades hospitalares deve ser profissional de nível superior, não sendo imprescindível a formação no curso de Administração. Em primeiro lugar, deve ser ressaltado que efetivamente a autora desempenhava atividades administrativas junto à Santa Casa de Uruguaiana/RS. Retrata essa situação o contrato de trabalho da fl. 14, que espelha a admissão da demandante como Diretora Administrativa da instituição hospitalar, bem como a própria afirmação, feita na peça inicial, de que o cargo de Administrador passou a ser denominado de Diretor Administrativo. Gize-se que tal panorama não é de forma alguma alterado pelos documentos das fls. 26/33. Contudo, muito embora a adequação das atividades e qualificação da autora com o instrumento normativo exarado pelo Ministério da Saúde, tal circunstância não é suficiente para arredar a autuação. Ocorre que a qualificação dos responsáveis pelas atividades diretivas das entidades hospitalares, definida pela Portaria do Ministério da Saúde, serve como exigência mínima perante aquele órgão. De fato, assim estabelece o art. 1° da Portaria n° 2.225/GM, de 05.12.02, do Ministério da Saúde (sem grifo):
‘Estabelecer exigências mínimas para a estruturação técnico/administrativa das direções dos hospitais vinculados ao Sistema Único de Saúde, sem prejuízo de outras que venham a ser consideradas necessárias em cada instituição. em decorrência de regulamentos específicos ou exigências legais, e critérios de qualificação profissional exigíveis para o exercício de funções nessas direções (…).’
Percebe-se, pois, que as exigências definidas na Portaria em análise não prejudicam – e nem poderia ser diferente, sob pena de inaceitável desrespeito à hierarquia das espécies normativas -, a observância das determinações legais que são aplicáveis à espécie. Assim, os requisitos estampados naquele ato normativo servem apenas como um mínimo a ser respeitado pelas instituições hospitalares perante o Ministério da Saúde. Corolário lógico dessa conclusão é que o desempenho de atividades administrativas continua sendo reservado aos Administradores, na forma delineada na Lei n° 4.769/65, mesmo diante dos termos da Portaria n° 2.225/GM, do Ministério da Saúde, vez que, além de não ser hábil a arredar disposições de lei em sentido estrito, aquele ato expressamente ressalva a observância das exigências legais e decorrentes de regulamentos específicos. Logo, também sob esse prisma, não prospera o pedido da autora, mantendo-se hígido o auto de infração. […]”.