SENTENÇA. AÇÃO OBJETIVANDO O CANCELAMENTO DE REGISTRO. PRÁTICA DE OPERAÇÕES DE FACTORING. AFASTADA PRELIMINAR DE COISA JULGADA. ATIVIDADE NA ÁREA DE ADMINISTRAÇÃO MERCADOLÓGICA E DE GERENCIAMENTO, BEM COMO FINANCEIRA E COMERCIAL. NÃO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE DE NATUREZA UNICAMENTE MERCANTIL. NECESSÁRIO O REGISTRO NO CRA.

SENTENÇA

RELATÓRIO

FUTURA SOCIEDADE DE FOMENTO MERCANTIL ingressa com ação de procedimento comum em face do CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO DA PARAÍBA (CRA-PB), objetivando o cancelamento de seu registro junto ao réu.

Expôs, na petição inicial, que:

Tem por objeto social a prática de operações denominadas, em conjunto, factoring, objetivando a aquisição e alienação, mediante pro-soluto de efeitos comerciais, de faturamentos e de direitos creditórios de terceiros, dentre outras atividades;

Foi notificada através do Ofício nº 949 que exercia atividade da profissão de Administrador, tendo procedido, assim, com o cadastro e devidos recolhimentos;

Em dezembro de 2015, recebeu uma notificação administrativa, onde foram cobradas as anuidades dos anos de 2011 a 2015, acrescidos de multa e juros; o seu não pagamento resultaria na inscrição do débito junto à dívida ativa;

Não realiza nenhuma atividade vinculada ao Conselho Regional de Administração;

Exerce atividade mercantil mista atípica, não possui em seus quadros profissionais da área de administração, é filiada ao Sistema Regulador de Operadores de Factoring do Brasil, tendo compromisso formal de seguir todas as normas e procedimentos de natureza legal, operacional, fiscal e ética, consubstanciadas em seu Código de Ética, não estando obrigada a se submeter ao julgo de outras entidades estranhas ao exercício da profissão;

Em ação distribuída em 2017 (processo nº 0809420-62.2017.4.05.8200), buscou a anulação das cobranças sofridas pela promovida, porém, o pedido foi julgado improcedente, uma vez que, àquela época, sua atividade preponderante exigia conhecimentos técnicos específicos na área de administração mercadológica e de gerenciamento, além de técnicas administrativas atinentes às esferas financeira e comercial;

O STJ tem entendido que empresa de factoring é dispensada da inscrição no CRA quando suas atividades são de natureza eminentemente mercantil, ou seja, desde que não envolvam questões estratégicas, técnicas e programas de execução voltados a um objetivo e ao desenvolvimento da empresa;

Em agosto de 2018, procedeu com alterações no seu contrato social, em especial no seu objeto, passando a exercer as atividades arroladas na cláusula terceira;

Assim, não mais exerce a função administrativa, mas contábeis e de fomento mercantil;

Com base nos novos objetos, requereu, na via administrativa, o cancelamento do registro, que restou indeferido, sob o argumento de que a simples atividade de factoring já incluiria a prática de atividades administrativas.

Por entender que não mais exerce qualquer atividade condizente com as abarcadas pelo CRA, requer o cancelamento do seu registro.

Decisão (id. 4058200.4136798) recebeu a inicial apenas em relação ao pedido de cancelamento do registro da autora junto ao Conselho réu, tendo em vista que a apreciação do pleito de anulação de débito fiscal ocorreu no seio do PJe n° 0809420-62.2017.4.05.8200, transitado em julgado em 2018. Na mesma oportunidade, este juízo indeferiu a tutela de urgência requerida e determinou o recolhimento de custas iniciais.

Custas processuais recolhidas (id. 4058200.4966813).

Citado (id. 4058200.7927217), o CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO DA PARAÍBA – CRA/PB ofereceu contestação (id. 4058200.7961890), requerendo preliminarmente a extinção do feito por tentativa de rediscutir coisa julgada. No mérito, pugnou pela improcedência da demanda, argumentando que as atividades exercidas pela autora demandam conhecimentos técnicos de administração, sendo necessária sua inscrição perante o Conselho competente.

Não houve impugnação à contestação (id. 4058200.9485361).

É o relatório. Decido.

FUNDAMENTAÇÃO

Preliminarmente – Da alegação de rediscussão de coisa julgada:

Alega a parte ré que a autora pretende rever coisa julgada ao tentar reabrir discussão já apreciada no PJe n°0809420-62.2017.4.05.8200.

Ocorre que o pedido veiculado no feito aludido dizia respeito unicamente à anulação de débitos oriundos de anuidades e multas dos exercícios de 2011 a 2015, não discutindo a legitimidade da inscrição da autora perante o conselho.

Em razão desse fato, a decisão de id. 4058200.4136798 recebeu a petição inicial unicamente em relação ao pedido de cancelamento do registro da empresa autora junto ao CREA/PB.

Isto posto, não havendo identidade de pedidos entre as ações, afasto a preliminar de coisa julgada levantada pelo réu.

Do mérito:

Cinge-se a controvérsia quanto à obrigatoriedade da autora, sociedade de fomento mercantil (factoring), em registrar-se no Conselho Regional de Administração.

A fiscalização por conselhos profissionais objetiva a regularidade técnica e ética do profissional, mediante a aferição das condições e habilitações necessárias para o desenvolvimento adequado de atividades qualificadas como de interesse público, determinando-se, assim, a compulsoriedade da inscrição junto ao respectivo órgão fiscalizador para o legítimo exercício profissional.

A Lei 6.839/80, que dispõe sobre o registro de empresas nas entidades fiscalizadoras do exercício de profissões, previu, em seu art. 1º, que a inscrição deve levar em consideração a atividade básica ou àquela pela qual as empresas e os profissionais prestem serviços a terceiros.

De acordo com o art. 15 da Lei 4.769/65, que dispõe sobre o exercício da profissão de Técnico de Administração, o registro de empresas nos Conselhos Regionais de Administração é exigido em casos de empresas, entidades e escritórios técnicos que explorem, sob qualquer forma, atividades do Técnico em Administração.

Nesse passo, conforme descrito no art. 2º do mesmo diploma legal, as atividades do Técnico de Administração serão exercidas da seguinte forma:

Art. 2º A atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, VETADO, mediante:

a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;

b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos da administração VETADO, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que êsses se desdobrem ou aos quais sejam conexos;

c) o exercício de funções e cargos de Técnicos de Administração do Serviço Público Federal, Estadual, Municipal, autárquico, Sociedades de Economia Mista, empresas estatais, paraestatais e privadas, em que fique expresso e declarado o título do cargo abrangido;

d) o exercício de funções de chefia ou direção, intermediaria ou superior assessoramento e consultoria em órgãos, ou seus compartimentos, de Administração Pública ou de entidades privadas, cujas atribuições envolvam principalmente, aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de administração;

e) o magistério em matéria técnicas do campo da administração e organização.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou-se, igualmente, no sentido de que o critério legal para a obrigatoriedade de registro nos conselhos profissionais e para a contratação de profissional específico é determinado pela atividade básica ou pela natureza dos serviços prestados pela empresa (AREsp 811601, Min. Sérgio Kukina, DJe 21/11/16). No mesmo sentido: AREsp 1165257, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 05/12/17; AREsp 1151153, Rel. Min. Assussete Magalhães, DJe 29/09/17.

Quanto às empresas de factoring, o STJ tem entendido que é dispensada a sua inscrição no Conselho Regional de Administração quando suas atividades forem de natureza eminentemente mercantil – ou seja, desde que não envolvam questões estratégicas, técnicas e programas de execução voltados a um objetivo e ao desenvolvimento da empresa. Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. EMPRESADE FACTORING. ATIVIDADE SUJEITA AO REGISTRO NO CONSELHOREGIONAL DEADMINISTRAÇÃO, NA ESPÉCIE. AGRAVO REGIMENTAL DAEMPRESA DESPROVIDO.

1. A 1a. Seção desta Corte, ao julgar o EREsp. 1.236.002ES, de minha Relatoria, uniformizou o entendimento pela desnecessidade de inscrição das empresas de factoring nos conselhos regionais de administração quando suas atividades forem de natureza eminentemente mercantil, prescindindo, dest’arte, de oferta, às empresas-clientes, de conhecimentos inerentes às técnicas de administração, nem de administração mercadológica ou financeira.

2. Na espécie, o Tribunal de origem, ao analisar o contrato social da empresa, consignou que a atividade básica desenvolvida por ela exige conhecimentos técnicos específicos na área de administração mercadológica e de gerenciamento, bem como técnicas administrativas atinentes às esferas financeira e comercial. Assim, em não se tratando de apenas factoring convencional, necessário o registro no respectivo Conselho Regional de Administração. Precedente: Resp 1.587.600SP, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 24.5.2016.

3. Agravo Regimental da empresa desprovido. (AgRg nos EDcl no RECURSOESPECIAL Nº1.186.111 – ES (20100052666-7), MINISTRO NAPOLEÃO NUNESMAIA FILHO, T1 – Primeira Turma, DJe 15/02/2017).

No caso dos autos, analisando o contrato social da autora, em sua “Cláusula Quarta” (id. 4058200.4115413), verifica-se que os objetivos da empresa são “1) A prática das operações denominadas, em conjunto, factoring, objetivando a exportação ou não, e especialmente: 1.1 – A aquisição e a alienação, mediante cessão pro-soluto de efeitos comerciais, de faturamentos e de direitos creditórios de terceiros; 1.2 – A execução de trabalhos de secretaria, faturamento, correspondência, classificação, pesquisa e documentação; 1.3 – A execução de todos os trabalhos necessários à cobrança, para os clientes da sociedade, de terceiros creditórios que lhes sejam devidos; 2) A prestação de serviços técnicos de assessoria financeira e comercial a pessoa jurídica nacional e estrangeira, podendo assumir contratos com a cláusula Del Credore; 3) A participação em outras sociedade como acionista ou quotista, fica alterado para Sociedades de fomento mercantil – factoring”.

Bem se vê, portanto, que a atividade preponderante da empresa exige conhecimentos técnicos específicos na área de administração mercadológica e de gerenciamento, bem como técnicas administrativas atinentes às esferas financeira e comercial.

Com efeito, os objetos previstos nos itens 1.2 e seguintes da cláusula quarta do contrato social extrapolam a atividade de factoring convencional, ingressando no domínio de fiscalização do Conselho réu.

Por fim, registro que a alegada alteração no contrato social não teve condão de excluir atividades próprias de profissional de administração da atuação da empresa, posto que limitou-se a acrescentar o trecho “(…)fica alterado para Sociedades de fomento mercantil – factoring” à parte final do item 3 da cláusula quarta.

Assim, constatado que a autora não exerce atividade de natureza unicamente mercantil, faz-se necessário o registro da empresa no respectivo Conselho Regional de Administração.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, julgo improcedente a ação, extinguindo o processo com resolução de mérito.

[…] (TRF5 – 3ª Vara Federal da Paraíba, PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL Nº 0809176-65.2019.4.05.8200, Juiz Federal Substituto ADRIANA CARNEIRO DA CUNHA MONTEIRO NOBREGA, Data de Julgamento: 30/11/2022)*