[…]
Com efeito, a Lei no. 4.769/65 (dispõe sobre o exercício da profissão de Técnico de Administração) estabelece, em seu artigo 2o, as atividades privativas do Técnico de Administração. Vejamos (destaquei):
“Art 2o A atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, VETADO, mediante:
a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;
b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos da administração VETADO, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que ste se desdobrem ou aos quais sejam conexos;
c) VETADO”.
Por seu turno, o exercício de tais atividades é, de regra, privativo do profissional que possui o bacharelado no campo da Administração, tal como prescrito no art. 3o do mesmo diploma normativo, abaixo transcrito (destaquei):
Art 3o O exercício da profissão de Técnico de Administração é privativo:
a) dos bacharéis em Administração Pública ou de Emprêsas, diplomados no Brasil, em cursos regulares de ensino superior, oficial, oficializado ou reconhecido, cujo currículo seja fixado pelo Conselho Federal de Educação, nos têrmos da Lei no 4.024, de 20 de dezembro de 1961;
b) dos diplomados no exterior, em cursos regulares de Administração,após a revalidação do diploma no Ministério da Educação e Cultura, bem como dos diplomados, até à fixacão do referido currículo, por cursos de bacharelado em Administração, devidamente reconhecidos;
c) dos que, embora não diplomados nos têrmos das alíneas anteriores, ou diplomados em outros cursos superiores e de ensino médio, contem, na data da vigência desta lei, cinco anos, ou mais, de atividades próprias no campo profissional de Técnico de Administração definido no art. 2o. (Parte vetada e mantida pelo Congresso Nacional)
Parágrafo único. A aplicação dêste artigo não prejudicará a situação dos que, até a data da publicação desta Lei, ocupem o cargo de Técnico de Administração, VETADO, os quais gozarão de todos os direitos e prerrogativas estabelecidos neste diploma legal.
Acrescento, ainda, que, para averiguar a necessidade de registro de empresas nos órgãos competentes para fiscalização do exercício de profissões, devem-se observar as atividades básicas exercidas por elas, em conformidade com o art. 1o da Lei no. 6.839/80, que dispõe o seguinte:
“O registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, serão obrigatórios nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros”.
A jurisprudência sobre o tema é reiterada no sentido de que o critério legal para verificação da obrigatoriedade ou não de registro em conselho profissional está relacionado às atividades básicas exercidas pela pessoa jurídica, inclusive sob a sistemática dos recursos repetitivos (os quais vinculam o presente Juízo 1), conforme aresto preferido pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, sendo observado pelos julgados que o sucederam, o que fica evidenciado com os Acórdãos da lavra da Segunda Turma daquela Corte Superior e da Oitava Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2a Região (destaquei):
[…]
Compulsando os autos, verifico que, dentre as atividades exercidas pela parte Autora, encontram-se as seguintes (Evento 1, DECL7): “Auxiliar o Gerente Administrativo Financeiro em atividades delegadas por ele”; “Coordenar e acompanhar os trabalhos dos Auxiliares, Assistentes Financeiros e Caixas da empresa”; “Realizar ou delegar e acompanhar Inventários Financeiros”; “Realizar ou delegar e acompanhar Conciliações Financeiras”; “Preparar relatórios com previsão de valores a pagar e a receber, em bases semanal e mensal”.
Posto isso, observo que grande parte das atividades realizadas pela Requerente se enquadram, expressamente, dentre aqueles privativas ao bacharel em Administração, prescritas em lei. Nesse sentido, não há como afastar o exercício da atribuição de “Preparar relatórios com previsão de valores a pagar”, da hipótese legal “mediante relatórios”, prevista na alínea ‘a’, do art. 2o, da Lei em comento. Da mesma forma, a atividade de “Auxiliar o Gerente Administrativo”, daquela prevista na mesma alínea, relativa à “assessoria em geral”.
Outra atividade que é eminentemente administrativa, consiste na coordenação e controle de pessoal e orçamentos. Nesse sentido, a Requerente coordena e acompanha os trabalhos dos auxiliares, assistentes financeiros e caixas da empresa, em verdadeira gestão de pessoas, inclusive no campo orçamentário, atividades estas previstas expressamente na alínea ‘b’ do art. 2o, Lei n. 4.769/65.
Cabe ressaltar que, além das atividades listadas acima, que recebem as mesmas denominações daquelas descritas na Lei de regência, é possível verificar que as demais também podem vir a se enquadrar nas privativas ao bacharel em administração, tais como “Controlar as Bonificações de Fábrica” (coordenação e controle de orçamentos – alínea ‘b’, art. 2o, Lei n. 4.769/65); “Manter controles dos pagamentos e recebíveis referentes a compromissos com cláusulas contratuais e pagamentos programados” (coordenação e controle de orçamentos – alínea ‘b’, art. 2o, Lei n. 4.769/65), entre outras.
Denota-se que as atividades preponderantemente exercidas pela Autora se inserem dentre aquelas privativas do profissional de Administração, sendo imperioso o reconhecimento da existência de vínculo jurídico entre as partes.
Cumpre registrar que, ainda que o signatário da Declaração apresentada informe que não é pré-requisito para o exercício da função, naquela Empresa, a formação em nível superior, trata-se tão somente de opção relacionada ao exercício de suas atividades econômicas, não interferindo na relação vertical entre Administração e administrado, sujeita ao princípio da legalidade.
Além disso, a expressão “menor complexidade”, utilizada pela Autora para classificar suas atribuições, consiste em conceito jurídico indeterminado que, no caso concreto, mostra-se inaplicável.
Isso porque atribuições relativas ao controle de pagamento e recebimento de veículos, fluxo de caixa, bonificações, preparação de valores a pagar e a receber e realização de inventários financeiros, controles de pagamentos e recebíveis decorrentes de contratos de leasing, manutenção de equipamentos e aluguéis, envolve o fluxo de valores financeiros consideráveis, dado se tratar de concessionária de
veículos, demandando daquele que as executa conhecimentos técnicos e diligências acima da média daqueles que não possuem formação superior específica.
Ademais, não procede a alegação de que a exigência de registro perante o Conselho profissional violaria a liberdade de associação, prevista no art. 5o, XX, da Constituição Federal. O direito fundamental invocado trata do interesse na satisfação da necessidade comum entre vários indivíduos, em uma relação horizontal. O que não é o caso dos autos.
De outro lado, a relação jurídica discutida nos presentes autos decorre do império da lei, com fundamento de validade na própria Constituição Federal (art. 149 2 ), em uma sujeição do cidadão ao poder de polícia estatal exercido por entidade de natureza autárquica, com a finalidade de atendimento do interesse público. Tanto o é que as anuidades destinadas aos conselhos profissionais possuem natureza tributária.
Por fim, situação da Autora em relação ao adimplemento, ou não, das anuidades, em nada interfere no reconhecimento do vínculo jurídico entre as partes, na medida em que é o dever de pagamento decorre da existência de relação jurídica, e não o oposto.
III – DISPOSITIVO.
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão autoral.Por via reflexa, resolvo o mérito da lide, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC (TRF2 – 3a Vara Federal Cível de Vitória, PROCEDIMENTO COMUM No 5014748-59.2018.4.02.5001/ES, Juiz Federal EDUARDO FRANCISCO DE SOUZA, Julgado em: 29/10/2019).
Trânsito em Julgado: 03/12/2019.