Panorama das Administrações Públicas: América Latina e Caribe 2017

As desigualdades suscitam um desafio crítico às administrações públicas. Não só prejudicam o crescimento económico e provocam problemas sociais, como também dificultam o acesso a oportunidades e a serviços públicos essenciais. Os governos desempenham um papel importante, mão só através dos impostos e das transferências, como também através da conceção e implementação de políticas que solucionem as desigualdades na distribuição dos rendimentos e outros resultados que afetam o bem‑estar das pessoas.

A região da América Latina e Caraíbas (ALC) continua a ser a região com maiores desigualdades no mundo, apesar de muito ter sido conseguido ao longo dos últimos anos como resultado de um crescimento sólido e de reformas estruturais. Para sustentar estas realizações numa conjuntura global difícil, os governos da ALC vão ter de conceber e implementar políticas que promovam o crescimento económico e a criação de emprego, continuando ao mesmo tempo a trabalhar para garantir um acesso mais equitativo por parte da população a serviços eficientes em termos de custos. Para tal, serão necessários dados concretos de elevada qualidade, disponibilizados atempadamente e comparáveis à escala internacional que possam informar a elaboração das políticas e aferir intervenções específicas. O “Panorama das Administrações Públicas: América Latina e Caraíbas 2017” disponibiliza esses dados concretos para orientação das reformas do setor público na região ALC.

Conclusões principais

Na região ALC, o Estado tem uma dimensão em média muito inferior à que tem nos países da OCDE. A despesa pública representa cerca de 31% do PIB em média nos países ALC, em comparação com 41,5% nos países da OCDE; mesmo assim, a diferença tem vindo a diminuir. Entre 2007 e 2014, a despesa aumentou 4,7% na região ALC em comparação com um aumento de 2,5% na OCDE. Em 2014, as administrações públicas ALC gastaram, em média, cerca de 8,7% do PIB com prestações sociais (p. ex., educação, saúde e pensões), enquanto este valor se cifrou nos 16,9% na zona da OCDE. Por sua vez, no mesmo ano, os países ALC empregaram menos pessoas em percentagem do total relativo ao emprego (12,4% na região ALC contra 21,6% nos países da OCDE). Em 2014, o investimento das administrações públicas em percentagem do PIB atingiu 2,6% nos países ALC em comparação com uma média de 3,2% na OCDE.

A política orçamental desempenha, em média, um papel mais restrito na distribuição de rendimentos na ALC do que nos países da OCDE. O sistema de benefícios fiscais cria um fosso entre o mercado e o rendimento disponível, reduzindo o coeficiente de Gini em 2,8% em média na ALC, contra 17,8% nos países da OCDE. Isto sucede devido a uma combinação de escalões de tributação direta menos progressivos; maior dependência dos impostos diretos, frequentemente regressivos; proliferação dos benefícios fiscais; e subsídios em diversos setores (p. ex., energia) que são mal direcionados e muitas vezes beneficiam quem tem mais. O potencial distributivo da intervenção governamental é, no entanto, muito superior quando é tida em consideração a despesa pública em espécie.

Os sistemas de saúde na região ALC são altamente fragmentados, quer em termos de prestação de serviços, quer em termos de financiamento. A maioria dos países tem vários regimes de financiamento coexistentes no domínio da saúde. Além disso, os gastos com a saúde pública são muitas vezes tratados como rubricas extraorçamentais não estando, consequentemente, sujeitos ao escrutínio completo do processo orçamental. Apesar de a cobertura ser relativamente elevada nos países ALC estudados, o pacote de bens e serviços disponibilizados aos beneficiários tende a ser menos abrangente do que nos países da OCDE. A eliminação da fragmentação e o melhoramento da coordenação constituem um desafio crucial para aumentar a eficiência dos gastos com a saúde na região ALC.

Os governos da região ALC ainda não criaram uma cultura de avaliação das políticas que consiga fazer muito para melhorar a conceção e implementação das políticas. Por exemplo, enquanto cerca de três quartos dos países ALC informaram ter uma estratégia nacional para o governo digital (e‑Governo), apenas ligeiramente mais do que um quinto referiu esforços para medir os benefícios financeiros dos projetos governamentais na área das TIC destinados aos cidadãos e às empresas. De igual modo, mais de 70% dos países ALC dispõem de estratégias de adjudicação de contratos públicos para a concretização dos objetivos de política secundários, mas apenas um número muito menor de países (6,3% no caso dos contratos públicos ecológicos e 28,6% no caso do apoio a MPME’s) mede os impactos dessas estratégias. Na mesma linha, apesar de os países terem adotado requisitos formais para a utilização de diferentes ferramentas de regulamentação, como a consulta e a avaliação do impacto regulamentar, a sua implementação na prática varia grandemente entre países e, tal como sucede nos países da OCDE, a avaliação ex post raramente é feita nos países ALC.

As funções de liderança e coordenação dos governos centrais têm aumentado de importância, mas incidem sobretudo nos procedimentos e menos nos conteúdos das políticas. O número de iniciativas interministeriais aumentou nos países ALC nos últimos anos, reflexo dos esforços para melhorar a função coordenadora do governo central. Por exemplo, 92% dos países ALC indicaram que as iniciativas abertas do governo são coordenadas pelo governo central. Tal como nos países da OCDE, as discussões sobre coordenação e políticas têm lugar através de reuniões do conselho de ministros e contactos bilaterais com os ministros. No entanto, comparando com os países da OCDE, os governos centrais na região ALC desempenham um papel mais ativo na análise e garantia da conformidade dos processos do que na avaliação, discussão ou decisão sobre novas políticas públicas.

A utilização do recrutamento com base no mérito melhorou na região, ao mesmo tempo que a avaliação do desempenho e a gestão de remunerações precisam de ser melhoradas. A contratação com base no mérito foi reforçada nos últimos 10 anos, sobretudo através da introdução de portais eletrónicos para o emprego estatal e do fortalecimento dos organismos da função pública. No entanto, em muitos países, a avaliação do desempenho tende a ter um cariz de mera formalidade, tendo pouco efeito no desempenho. Por sua vez, em muitos países, abundam as desigualdades salariais ‑ quer horizontais (mesma responsabilidade, salário diferente) e verticais (posições hierarquicamente superiores com salário inferior) – e têm‑se agravado com o passar do tempo.

Fonte: Organisation for Economic Cooperation and Development (OECD)