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Quantidade de neurodivergentes levantam necessidade de debate sobre o assunto

Novos diagnósticos em todo o mundo sobre o grande número de pessoas neurodivergentes mostram a necessidade de inclusão e políticas sobre o tema

Por Ana Graciele Gonçalves

Nos últimos anos tem crescido a conscientização sobre a importância da inclusão de pessoas neurodivergentes no mercado de trabalho. Mas quem são esses profissionais? 

Neurodivergentes são indivíduos cujo funcionamento neurológico ou desenvolvimento cognitivo se desvia do que é considerado típico ou padrão. Isso pode se manifestar em condições como Transtorno do Espectro Autista (TEA), dislexia e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). 

O termo ‘neurodivergência’ faz menção a um indivíduo, enquanto neurodiversidade se refere a um grupo de pessoas. Não se trata de um termo médico, mas de uma palavra que gera identidade. 

De acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC), a prevalência global do autismo é estimada em cerca de uma a cada 160 crianças. No Brasil não existem dados precisos sobre a prevalência do autismo, mas estima-se que a condição afete aproximadamente 1% da população mundial. 

Com relação ao TDAH, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a condição afete entre 5% e 7% das crianças, em idade escolar, em todo o mundo. Assim como no autismo, informações sobre a prevalência do TDAH no Brasil também são limitadas. 

A falta de dados sobre os neurodivergentes no país está, no entanto, perto de ser solucionada. A Câmara dos Deputados aprovou, no dia 20 de dezembro de 2023, o Projeto de Lei 4459/2021, que inclui nos Censos Demográficos perguntas específicas sobre a ocorrência de casos diagnosticados de Doenças Raras, Dislexia, TDAH, Visão Monocular e Transtorno do Espectro Autista (TEA). A proposta recebeu parecer favorável da relatora, a deputada federal Maria Rosas (Republicanos-SP).

A proposta segue para análise do Senado e, uma vez aprovada pelas duas casas, as novas regras passam a valer 360 dias após a data de publicação. A nova lei será um passo fundamental para mapear esse público e, com isso, direcionar políticas públicas adequadas para promover a inclusão e a atenção integral a esse grupo.

Inclusão

Apesar de estudos indicarem que entre 15% e 20% da população global apresenta alguma forma de neurodiversidade, apenas uma em cada dez organizações aborda especificamente o tema em seus programas de inclusão. Para o administrador e analista de onboarding de novos clientes na Activesoft, Leonardo Medeiros, isso acontece por falta de conhecimento da população sobre o tema.

Segundo Medeiros, que é um profissional neuroatípico, no Brasil o aspecto mais discutido é o autismo e, mesmo assim, o assunto vem acompanhado de muito preconceito e falta de informação. “Fora o autismo ainda têm diversos espectros como TDAH, dislexia, Síndrome de Tourette, discalculia, disgrafia, entre outros que não são muito discutidos, gerando assim a falta de informação para a sociedade”, explica.

O administrador aponta, ainda, que outro ponto que atrapalha essa inclusão é a falta de políticas públicas e leis que apoiam os neurodivergentes. “Inclusive, esse público não é incluído na lei do PCD, o que, na minha opinião, é um erro”, comentou.

Papel do RH

Para tornar o ambiente corporativo muito mais atrativo e acolhedor para os profissionais neurodivergentes, os gestores de RH precisam saber identificar as necessidades desses colaboradores. “Esse conhecimento se inicia lá na etapa do encantamento verdadeiro do processo de seleção. Deixar o profissional confortável vai permitir que esse relacionamento seja de confiança e segurança para ele. Assim ele irá compartilhar, no tempo dele, essas necessidades”, orienta a administradora e Head de Gente & Gestão na Activesoft, Léxia Lopes.

Segundo Léxia, na empresa em que trabalha várias ações já foram adotadas para proporcionar um ambiente mais inclusivo para os neurotípicos. Mas, para tanto, ela diz que os primeiros passos são o gestor de RH abrir a mente para a situação ao buscar mais conhecimento, além de orientar o gestor imediato desse profissional.

É importante, ainda, as organizações oferecerem formatos de trabalho híbrido e, na impossibilidade deste, investir em ambientes mais adequados para esses profissionais. “Geralmente, profissionais com TDAH precisam, por exemplo, de um ambiente mais tranquilo e silencioso, pois se há agitação fora do comum para ele, é possível que haja desregulação emocional, e ele vai precisar de um tempo a mais para se restabelecer emocionalmente”, esclarece Léxia.

Acesse o QR Code ao lado e conheça o case de sucesso de Caio Bogos.

História inspiradora

Desde a adolescência, o jovem Caio Bogos tinha um desejo: criar um projeto de impacto social utilizando a tecnologia. Em 2017, quando ele entrou para o curso de Sistemas de Informação, esse desejo cresceu e, ao longo da vida acadêmica, começou a pensar em formas para realizar esse projeto.

A oportunidade chegou no segundo ano da graduação em um desafio tecnológico proposto pela faculdade: criar uma solução para pessoas autistas. “Como tinha pouco conhecimento técnico sobre a causa, mas ao mesmo tempo tinha muita vontade de fazer algo, pensei inicialmente em fazer uma plataforma que acompanhava a evolução da criança autista”, relata Caio.

Com o tempo, ele percebeu que havia um problema ainda maior a ser resolvido – a inclusão de pessoas autistas no mercado de trabalho. Segundo Caio, essa percepção veio depois de pesquisas e estimativas apontarem que mais de 80% da comunidade autista está fora do mercado de trabalho. “Com essa estatística em mente, decidimos mudar o rumo do projeto em 2021 e ser o que somos hoje: um ecossistema de inclusão de pessoas neurodivergentes”, diz.

Assim nasceu a ‘aTip’, hub que busca promover a criação de um ambiente de trabalho inovador e acolhedor , pautado na valorização da neurodiversidade. “Por ora, estamos muito focados no autismo, mas já estamos com planos de expandir para outras divergências como TDAH, altas habilidades, entre outras”, conta.

Depois de fundar a ‘aTip’, Caio começou a se identificar com algumas características atípicas. Em 2022, ele descobriu que é autista. Receber o diagnóstico já adulto não foi um processo tão fácil. “Mesmo liderando uma empresa de inclusão, eu mesmo tive as minhas inseguranças em relação a quem eu era e o que eu poderia entregar para a sociedade”, relembra. 

Ao longo dos anos, a ‘aTip’ já ajudou muito profissionais neurodivergentes a se integrarem ao mercado de trabalho. Foram geradas muitas oportunidades indiretas que às vezes não chegaram ao conhecimento da empresa. “Somente no ano passado foram mais de 20 oportunidades geradas diretamente por nós, em empresas como OLX Brasil, Vivo, EY e TOTVS”, celebra Caio.