SENTENÇA
CALSENG SERVIÇOS LTDA. ajuizou a presente AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM, em face de CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO DE MINAS GERAIS, objetivando o cancelamento do Registro de Pessoas Jurídicas junto ao referido conselho, inclusive pugnando a concessão de antecipação da tutela.
Sustenta a autora que realizou solicitação junto ao CRA-MG para cancelar o registro da empresa no conselho profissional, todavia, lhe foi negado em razão da necessidade de comprovação de alteração de suas atividades ou alteração de seu contrato social.
Fundamenta que não é obrigada a se manter afiliada a órgãos de classe, tendo em vista a garantia constitucional prevista no art. 5°, da CF/88, não sendo possível, segundo sua tese, exigir qualquer documento ou alteração, bastando a solicitação de cancelamento. Inicial instruída pelos documentos necessários.
Não concedida a antecipação da tutela (ID806680148).
Citado, o conselho demandado apresentou contestação no ID861780580, em que sustenta que as exigências para cancelamento de inscrição no CRA são normas editadas pelo conselho federal e que não afrontam a garantia constitucional apontada pelo autor. Ainda, relata que agiu conforme seu poder de polícia no tocante às profissões regulamentadas, e que o pedido de cancelamento foi indeferido em razão da desconformidade com o regulamento vigente.
Impugnação à contestação no ID900019047.
É o relato. Fundamento e decido.
A empresa demandante objetiva o cancelamento do registro profissional em razão da garantia constitucional de livre associação.
Nesse sentido, nota-se que a atividade fiscalizatória exercida pelos conselhos profissionais é decorrente da delegação do poder de polícia, atuando em defesa da sociedade, do interesse público e social, regulamentando o exercício das profissões por meio de diretrizes e normas próprias.
O STJ já proferiu entendimento acerca da matéria em questão:
ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. REGISTRO DE PESSOA JURÍDICA. VENDA DE MEDICAMENTOS VETERINÁRIOS E COMERCIALIZAÇÃO DE ANIMAIS VIVOS. DESNECESSIDADE. LEI N.5.517/68. ATIVIDADE BÁSICA NÃO COMPREENDIDA ENTRE AQUELAS PRIVATIVAMENTE ATRIBUÍDAS AO MÉDICO VETERINÁRIO. RECURSO SUBMETIDO AO RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. 1. O registro da pessoa jurídica no conselho de fiscalização profissional respectivo faz-se necessário quando sua atividade básica, ou o serviço prestado a terceiro, esteja compreendida entre os atos privativos da profissão regulamentada, guardando isonomia com as demais pessoas físicas que também explorem as mesmas atividades. 2. Para os efeitos inerentes ao rito dos recursos repetitivos, deve-se firmar a tese de que, à míngua de previsão contida da Lei n.5.517/68, a venda de medicamentos veterinários – o que não abrange a administração de fármacos no âmbito de um procedimento clínico – bem com a comercialização de animais vivos são atividades que não se encontram reservadas à atuação exclusiva do médico veterinário. Assim, as pessoas jurídicas que atuam nessas áreas não estão sujeitas ao registro no respectivo Conselho Regional de Medicina Veterinária nem à obrigatoriedade de contratação de profissional habilitado. Procedentes. 3. No caso sob julgamento, o acórdão sob julgamento, o acórdão recorrido promoveu adequada exegese da legislação a respeito do registro de pessoas jurídicas no conselho profissional e da contratação de médico-veterinário, devendo, portanto, ser mantido. 4. Recurso especial a que se nega provimento. Acórdão submetido ao rito do art. 543-C do CPC/1973, correspondente ao art. 1.036 e seguintes do CPC/2015. (REsp.1338942/SP. Rel. OG FERNANDES. Dje.03/05/2017).
A parte autora sustenta que a obrigatoriedade de inscrição em conselho de fiscalização viola o direito fundamental à liberdade de associação, constante no art. 5°, XX.
Todavia, preleciona também o art. 5°, XIII, da CF que “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;”. Nota-se que o texto constitucional faz ressalva às regulamentações profissionais estabelecidas por lei.
Diante da previsão, a Lei 6.839/1980 dispõe sobre o registro de empresas nas entidades fiscalizadoras do exercício da profissão:
Art. 1º O registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, serão obrigatórios nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros.
Nesse sentido, não fere o direito de livre associação a obrigatoriedade de inscrição em conselho profissional para empresas que exerçam profissão regulamentada, sendo submetidas à fiscalização.
Pois bem. Na espécie, importa verificar se a atividade básica da empresa tem correlação com o registro no Conselho profissional demandado como atividade principal.
Da análise do contrato social da empresa que instrui a peça autoral (ID764702468), retira-se que o objeto social é:
“prestação de serviços em geral, a saber: manuseio, recepção, portaria, digitação e processamento de dados; serviços de planejamento e customização, fornecimento de mão de obra especializada e semi-especializada, serviços de conservação, asseio, higiene e limpeza comercial, industrial, bancária, hospitalar e rural em geral, serviços de limpeza urbana, tais como: coleta de lixo, capina, roçagem, podas de árvores, pintura de meios-fios, limpeza de boca de lobo (bueiros), retirada e transporte de entulhos, locação de máquinas, equipamentos e veículos (leves e pesados), caçambas, contêineres e contentores. Serviços de sinalização estratigráfica horizontal e vertical, controle de tráfego urbano (meios de dispositivos eletrônicos), tráfego (classificada e volumétrica). Serviços de conservação em rodovia municipal, estadual e federal. E a prestação de serviços de vigilância desarmada. Construções, edificações e incorporação de imóveis próprios e de terceiros.”
Nota-se que a atividade básica exercida pela empresa possui correlação com o conselho profissional demandado, ou seja, atividade típica de administração.
Art 2º A atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, mediante:
a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;
b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e contrôle dos trabalhos nos campos da administração, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que êsses se desdobrem ou aos quais sejam conexos; (Lei 4.769/1965).
É o que consolidou a jurisprudência:
ADMINISTRATIVO. CONSELHO PROFISSIONAL. REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. ATIVIDADE BÁSICA. TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE SEGURANÇA, VIGILÂNCIA E TRANSPORTE DE VALORES, BEM COMO DE ASSEIO E CONSERVAÇÃO. ATIVIDADE RELACIONADA À ADMINISTRAÇÃO PESSOAL. NECESSIDADE DE REGISTRO. ATIVIDADE RELACIONADA À ADMINISTRAÇÃO PESSOAL. NECESSIDADE DE REGISTRO E POSSIBILIDADE DE FISCALIZAÇÃO. 1. A exigência de inscrição da empresa em conselho profissional só pode ser feito em relação à sua atividade básica, nos termos do art. 1° da Lei 6.839/1980. 2. A empresa que tem como atividade de segurança, vigilância ou transporte de valores não está obrigada a registrar-se no Conselho Regional de Administração, por inexistência de dispositivo de lei que a obrigue. 3. Porém, a empresa que terceiriza serviços de mão de obra, ainda que seja no ramo e segurança, vigilância, transporte de valores, asseio e conservação, está obrigada a registrar-se no Conselho Regional de Administração, uma vez que sua atividade básica é a administração e seleção de pessoal, atividades típicas e privativas do técnico de administração, na forma do art. 2°, b, da Lei 4.769/1965. 4. Apelação do Conselho e remessa oficial a que se dá parcial provimento. (TRF1 – AC 0067551-66.1999.4.01.0000/PA, Rel. JUIZ FEDERAL CARLOS EDUARDO CASTRO MARTINS, Data de julgamento: 08/10/2012).
Pelo exposto, o CRA-MG agiu em consonância com a legislação e com o regulamento do Conselho Federal de Administração, exigindo a comprovação de encerramento das atividades ou a alteração contratual da empresa, demonstrando que o objeto social não mais é correlacionado à profissão regulamentada.
Isto posto, considerando que não há documentação que demonstre tais alterações aptas a evidenciar que a empresa não mais exerce atividade de administração, não há que se falar em abusividade da negativa de cancelamento da inscrição por parte do CRA-MG, devendo permanecer submetida à fiscalização do conselho profissional demandado.
Ante o exposto, com esteio no art. 487, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial. Em consequência, condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da causa, com base no art. 85, §2º do CPC, bem como as custas processuais.
[…]
(TRF6- Procedimento Comum número: 1013215-63.2021.4.01.3803. Juiz Federal LINCOLN RODRIGUES DE FARIA, julgado em: 08/10/2024)