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Entrevista Especial – Luis Almanza fala sobre gestão, valores e povos originários

Luis Almanza aplica tais conceitos no seu dia a dia à frente de grandes instituições representativas e educacionais em administração da América Latina 

Por Leon Santos

O administrador peruano Luis Cesar Molina Almanza é o entrevistado da edição 151 da RBA. Palestrante do Fórum Internacional de Administração (FIA/ CFA), realizado no mês de setembro em Belém-PA, ele aproveitou a visita para anunciar — ao lado do presidente Mauro Kreuz (CFA) e Gilmar Camargo (diretor de relações internacionais do CFA) — a fundação da Rede Internacional de Administração (RIADM).

Professor do ‘Instituto Superior Simón Bolívar’ e primeiro vice-decano nacional do ‘Centro Latino-Americano de Administração para o Desenvolvimento (CLAD)’, Almanza falou sobre administração, cultura latino-americana, educação e troca de conhecimentos.

Analisou o cenário do segmento em seu país e também sobre conhecimentos necessários para o mercado de trabalho da atualidade. Erudito e visionário, ele é hoje um dos principais nomes representativos da administração na América do Sul. 

 

RBA – Durante o Fórum Internacional de Administração (FIA), o senhor explicou o conceito de ética, segundo a visão dos povos originários ou nativos da América do Sul. Como tal conceito poderia ser aplicado à administração moderna, presente hoje em dia na América Latina?

Os povos originários da América do Sul tinham princípios fundamentais de ética que promoviam o trabalho, a verdade e a honestidade. Somada a essas máximas se encontra também a cultura da reciprocidade e da contribuição ao bem social. Também existe a prática ancestral de colaborar com uma família nas tarefas agrícolas: ao ajudar na colheita existe a premissa de que esta será retribuída, quando solicitada, com apoio em trabalhos em ocasiões futuras. 

Da mesma maneira, estabeleciam-se jornadas de trabalhos comunitários para executar alguma obra de interesse comum, em benefício da população, como exemplo na construção de estradas, hospedarias, fazendas de produção de leite e armazéns. Tais práticas podem ser utilizadas para valorizar a ética na função pública e promover a vocação de serviço nas instituições governamentais. 

A América Latina deve se reconectar com suas raízes e aproveitar o legado cultural e os valores ancestrais para propiciar seu desenvolvimento, algo similar ao processo realizado na Índia.

Em termos de gestão pública, o que prejudica ou causa mais danos para a população: a corrupção, por meio dos desvios de recurso, os desvios de finalidade ou a demora em concluir as obras?

A corrupção é um mal comum, presente em toda a América Latina. Ela se manifesta sob a forma de suborno (corrupção passiva), concussão (exigência de dinheiro para exercer ato inerente ao cargo) e peculato (apropriação de um bem público, facilitado pelo cargo que ocupa). Esses são os atos mais recorrentes. Contudo, no meu país tem havido ainda outras formas delitivas, tais como organizações ou associações criminosas. 

No campo político, lamentavelmente, tivemos quase todos os governantes dos últimos 30 anos processados por atos de corrupção, com desvios milionários de dinheiro público, propinas e superfaturamentos (de obras e serviços) que afetaram o Estado.  Esse é um fato recorrente nas altas esferas de governo, mas vem sendo reduzida, devido ao controle de execução fiscal e à informatização da autorização do gasto público.

Sobre a demora ou o atraso das obras, eles podem ser gerados pela falta de habilidade ou imperícia na gestão e controle da execução das obras ou despesas. Também podem ser gerados expressamente para gerar pagamentos adicionais a fornecedores (corrupção oculta) ou para prorrogar o pagamento de despesas administrativas (folha de funcionários ou servidores públicos). 

Tudo isso por interesses escusos, contrários ao interesse geral da população. Todos esses casos são prejudiciais tanto para o Estado como para a população. No entanto, atrasar a execução de obras ou contratos por atos de corrupção, prejudicando a população por inércia, constitui o caso mais grave. 

Como o senhor analisa o ensino da administração em seu país e o que vocês, peruanos, poderiam ensinar aos brasileiros em termos de troca de experiências?

O ensino da administração deve responder às necessidades das iniciativas pública e privada. Deve se adaptar às novas exigências do ambiente, como por exemplo, adoção de tecnologias de informação, automação, domínio de idiomas e visão global sistêmica. 

No meu país foram implementados, na última década, sistemas especializados para gestão, tais como o SIGA, SIAF, DATA CRIMI, SIGE que são fundamentais para a gestão administrativa. Creio que as instituições de ensino precisam se adaptar e incluir na formação dos gestores tais conhecimentos. 

No campo do setor privado, da mesma forma, é necessário que os estudantes conheçam e dominem a gestão de sistemas como SAP, ERP ou CRM para que os egressos tenham maior nível de competitividade para poderem trabalhar, por exemplo, no megaporto de Chancay — cuja primeira etapa estará em operação no início de 2023. São necessários tais conhecimentos, que são adicionais aos conhecimentos tradicionais da profissão. 

Conte-nos sua trajetória profissional: desde sua formação educacional, experiências laborais e como é seu dia a dia dentro do CLAD. Qual é a importância da instituição para a América Latina?

Fiz minha formação profissional na Universidade Nacional de Callao, no Peru. Inicialmente, trabalhei no setor de consultoria, monitorando projetos empresariais na ONG PROBIDE e na Escola de Prefeitos. 

Depois trabalhei como funcionário público no sistema universitário, por mais de treze anos, alternando as funções administrativas com as de docência nos cursos de graduação, bacharelado e tecnológico. Hoje atuo como chefe da área de administração de empresas do ‘Instituto Superior Simón Bolívar’ e no projeto de uma filial do instituto. 

Soma-se a tudo isso as atividades de secretário técnico e diretor de capacitação da ‘Câmara de Comércio, Desenvolvimento e Indústria Peru Rússia’. Já no CLAD (Centro Latino-Americano de Administração para o Desenvolvimento), fui decano nacional até 31 de dezembro de 2021, e atualmente ocupo o cargo de primeiro vice-decano nacional. O CLAD, assim como o CFA, é uma autarquia (pessoas jurídica de direito público interno) representante dos profissionais da administração — com capacidade de representar iniciativas legislativas. 

Durante o meu decanato, conseguimos a aprovação da lei que delimita e protege o campo do exercício profissional dos administradores na Administração Pública. Da mesma forma, foram apresentadas ao debate propostas legislativas para tornar transparentes os processos de seleção na administração pública e estabelecer princípios de meritocracia e pertinência na nomeação de cargos públicos que correspondam ao perfil do licenciado em administração. 

Leia o restante dessa entrevista na RBA 151