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Profissão: mãe e empreendedora

 

Investir no próprio negócio tem sido a saída para muitas mulheres que desejam estar mais perto dos filhos sem abrir mão da vida profissional

Quando estava grávida da sua primeira filha, a servidora pública Agda Yosan buscava uma decoração clean para o berço da sua primogênita e não encontrava nada no mercado com tais características. Decidiu, então, costurar esse item do enxoval da pequena Anastácia, hoje com seis anos de idade. Nascia, ali, não só uma mãe, mas também uma empreendedora.

Assim como Agda, milhares de mulheres começam a empreender após a chegada dos filhos. Segundo dados da Rede Mulher Empreendedora (RME), a maternidade foi o grande empurrão para 75% das mulheres que decidiram abrir o próprio negócio no Brasil.

Itens para enxoval de bebê da Batatinha Craft

A chave para o empreendedorismo girou mesmo na gravidez da sua segunda filha. Por recomendação médica, Agda precisou de repouso e teve uma licença prolongada. Em casa com duas filhas, ela sentiu necessidade de ser mais produtiva e ter um horário mais flexível. Começou a costurar outras peças e logo em seguida surgia a Batatinha Craft. “A maternidade me fez abrir o olhar, tirar o foco do serviço público exclusivo e pensar em novas formas de organização de trabalho, de sustento, de renda”, conta.

Mas o empreender materno nem sempre começa por opção. Segundo pesquisa feita pela Fundação Getulio Vargas (FGV), 48% das mulheres são demitidas após a licença-maternidade. Foi o que aconteceu com Adriana Teles há sete anos, quando nasceu seu primeiro filho. Ela trabalhava como terceirizada em um órgão público. Na época, teve um corte de pessoal e ela estava na lista. A demissão veio após a licença-maternidade. “Para mim foi um baque, pois eu sempre trabalhei desde os dezoito anos e, pela primeira vez, me vi perdida com uma criança”, desabafa.

Passado o susto, ela deu a volta por cima e tornou-se sócia do marido em uma produtora cultural. Com a escassez de editais na área de projetos culturais, ela encontrou na paixão pelo artesanato uma fonte de renda. A Drica Cria, marca assinada por ela, oferece uma gama de opções em papelaria personalizada.

Para a administradora Érika Jarjour, essa realidade é um fator que contribui para a migração de mulheres para o empreendedorismo. Porém, segundo a especialista, isso se soma ao desejo da mãe de estar mais presente na vida dos filhos. “Dentro de uma realidade de submissão a uma jornada de trabalho, com horários a cumprir, se inviabiliza. Assim, quando se veem desempregadas, elas se despertam para a oportunidade do trabalho autônomo, do negócio próprio, que permitem, em tese, essa maior dedicação à criação dos filhos, especialmente durante a primeira infância”, explica Érika.

A importância do planejamento

O empreendedorismo, seja por opção ou por necessidade, exige cuidado. Para se ter ideia, de acordo com levantamento da RME, feito em 2018, 86% das empreendedoras não se planejam antes de iniciar um negócio. A boa notícia é que as mulheres que ainda estão pensando em abrir um negócio planejam mais do que aquelas que já começaram.

É preciso fazer, segundo Érika, “um plano de negócios, um planejamento e estudo para saber a viabilidade do negócio, inclusive sob o ponto de vista do lucro.”.

A administradora diz, ainda, que é preciso desmitificar o glamour exaltado quando o assunto é ter o próprio negócio. “Por trás da beleza do empreendedorismo sempre tem a necessidade do trabalho árduo, do esforço desmedido, da paciência com a engrenagem emperrada da burocracia brasileira”, enumera a especialista.

Antes de começar a trabalhar com papelaria personalizada, Adriana dedicou tempo estudando o assunto. Foi atrás de vídeos para aprender mais sobre o futuro negócio, investiu em material e em máquinas. A propaganda boca a boca foi essencial para fazer seu trabalho ficar conhecido. As amigas, principalmente as que são mães, foram as primeiras clientes. “A gente meio que se une nesse momento, uma corrente amiga para dar esse apoio”, diz.

Perfil multitarefas

A pesquisa da RME mostra que entre os negócios consolidados, 69% estão na área de serviços. Além disso, a maioria – 32% – das empreendedoras estão na categoria de micro empreendedora individual (MEI).

Personalizados para festas é o carro chefe da Drica Cria

Essa realidade é ratificada pelo estudo da Pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM): 35% das mulheres empreendem dentro de casa. É o caso de Agda e Adriana. Ambas montaram um home office e ateliê em suas respectivas residências.

Contudo, trabalhar em casa exige uma dose extra de planejamento. Afinal, a mulher desempenha, em um único local, vários papeis. Adriana lembra que, em diversas situações, ela precisou trabalhar com a filha mais nova no colo.

Para Agda, a grande dificuldade que a mulher enfrenta para empreender como mãe é a sobrecarga física e emocional. E não é para menos: elas cuidam dos filhos, fazem serviços domésticos e, em meio a isso tudo, tocam o próprio negócio. “Nós, mulheres, precisamos delegar mais e não querer controlar tudo, o tempo todo”, afirma, ressaltando que é preciso envolver a família, principalmente os parceiros, nessas atividades para que a empreendedora consiga se dedicar ao seu trabalho. “Os homens, aos poucos, quando veem esse movimento, começam a entender o seu papel dentro da família e passam a cooperar mais para que o negócio que essa mulher propõe possa crescer”, conta.

Como chegar lá

Muitas mulheres se identificam com as histórias de Agda e Adriana, mas não sabem por onde começar a empreender. Para quem chegou lá, a recomendação é buscar trabalhar com o que gosta. “Procure oportunidades, veja as carências do mercado e, ao identificá-las, reflita se estão dentro do seu rol de afinidades, gostos”, ensina Érika.

Cautela na hora de decidir, evitar agir impulsivamente ou com desespero e buscar ajuda nas questões que não tiver conhecimento ou segurança são outras dicas da especialista.

Agda conta que muitas mulheres esbarram nas dificuldades técnicas. “É preciso aprender a empreender, pois a gente não aprende isso na escola e nem na vida”, destaca. Pensando nisso, ela decidiu ajudar outras mulheres por meio do “Grupo de Desafios Além da Costura”.

Apesar do nome, o grupo também aceita empreendedoras de outros segmentos. Em 30 dias, as participantes recebem desafios diários que ajudam a desenvolver seus negócios. “A ideia é trazer noções básicas e essenciais de empreendedorismo, de organização, de posicionamento nas mídias, para que elas possam profissionalizar o seu negócio”, conta. O grupo já atendeu mais de cem mulheres, de várias partes do Brasil.

O pulo do gato

Por fim, Agda aconselha: “A minha dica é, invista em você. A empreendedora materna geralmente trabalha sozinha, ela é o seu maior ativo, ela é a parte mais importante do seu negócio. Primeiro, a mulher precisa investir nela mesma para crescer e aprender coisas novas e ela precisa investir na sua saúde física e mental, e qualidade de vida. O melhor investimento que você pode fazer pelo seu negócio é investir em você mesma.”.

 

Perfil

Agda Yosan

·        32 anos

·        Casada

·        Mãe de três: Anastácia, 6; Pérola, 4; Dandara, 10 meses.

·        Assistente Social

·        Servidora pública

·        Empreendedora da Batatinha Craft

Adriana Teles

·        36 anos

·        Casada

·        Mãe de três: Davi, 7; Olívia, 5; Elisa, 3.

·        Publicitária

·        Gestora cultural

·        Empreendedora da Drica Cria

 

Ana Graciele Gonçalves

Assessoria de Comunicação CFA