O Sistema Conselhos Federal e Regionais de Administração segue atento aos mais diversos campos da sociedade. E um dos assuntos em debate e que está relacionado à gestão, ou melhor, à falta dela, é o caso envolvendo transplantes de órgãos infectados com HIV, no Rio de Janeiro.
Segundo as autoridades, o laboratório PCS Lab Saleme emitia laudos falsos negativos para o vírus, pois operava com redução no controle de qualidade com o objetivo de aumentar a lucratividade. O esquema resultou na contaminação de seis pessoas. Para o coordenador da Comissão Especial de Gestão de Serviços em Saúde do Conselho Federal de Administração (CFA), Adm. Manoel Carlos Rocha Lima, a grave falha no conjunto de práticas e procedimentos revela amadorismo da gestão da saúde no Brasil.
“Isso deixa evidente que a gente precisa ter profissionais capacitados e preparados para isso. E quando eu falo preparados, eu não falo apenas do ponto de vista técnico assistencial, mas também do ponto de vista da Administração. É claro que o setor precisa conhecer, de um modo geral, o funcionamento, a dinâmica do setor de saúde. Mas a base está nos conhecimentos de planejamento, direção, organização, controle, que são as funções básicas da Administração.”
O controle de qualidade verifica os processos, analisa se estão de acordo com os padrões, identifica falhas, faz correções e evita problemas. Na prática, quando ele falha, o resultado pode ser desastroso, como o visto no Rio de Janeiro.
Na avaliação do membro da comissão do CFA e coordenador da Comissão Especial de Gestão em Saúde do Conselho Regional de Administração do Paraná (CRA-PR), Adm. Marcelo Iwersen, o problema tem raízes mais profundas, com erros de gestão iniciados ainda no processo de licitação do laboratório PCS Lab Saleme .
“Então, começa uma competência e responsabilidade dos dirigentes da área estadual de saúde, os setores que preparam o edital para esse tipo de processo. O que faltou, uma das palavras-chaves das funções dos administradores, foi principalmente controle, mas provavelmente também conhecimento do que é a responsabilidade de um processo como esse, o padrão de exigência que deve existir. Qual é a estrutura que existe nos laboratórios que concorrem? Qual é a estrutura física, a estrutura de equipamentos, a estrutura de pessoal? Quem são as pessoas técnicas que vão operacionalizar e vão proceder a realizar os exames? Estão certificados, estão vinculados aos seus respectivos conselhos regionais? A seguir é da responsabilidade do prestador, que foi escolhido através do pregão no conceito de, lamentavelmente, de só preço mínimo.”
É consenso entre os especialistas que o problema inédito no país é difícil de se administrar, pois envolve a segurança dos testes. No entanto, o caso deve servir de alerta para autoridades e organizações mensurarem o custo de não investir em gestão focada na qualidade.
Agora, será necessário o emprego de recursos públicos na investigação e no acompanhamento dos infectados, além de maiores investimentos em campanhas educativas sobre doação de órgãos, entre outros custos.
Apesar do grave erro, Iwersen reforça que o caso isolado não pode servir de parâmetro para medir a eficiência do sistema de transplantes brasileiro, visto que ele funciona há tanto tempo sem outras intercorrências desse tipo.
“Cabe às autoridades, do nível federal, estadual e municipal, é a responsabilidade imediata, o compromisso de rever toda a situação. De viver toda essa situação para que não aconteça, não ocorra mais isso. E que se avalie a responsabilidade das pessoas envolvidas em todos esses processos”.
Outro consenso entre os especialistas em gestão da saúde é que a área demanda profissionais de administração para gerir recursos humanos, financeiros e materiais com conhecimento, preparação e habilidade necessários.
“No setor de saúde, devido a uma questão cultural, acredita-se que apenas os profissionais de saúde tem qualificação para isso. E muitas vezes não tem, porque eles não são preparados para isso. É importante que a gente tenha, junto a esses profissionais de saúde, profissionais preparados, qualificados, formados em gestão, para que possam contribuir efetivamente para esse processo”, defende Lima.
“O profissional da administração tem o conhecimento desde a base daquilo que é necessário para se fazer, para se contratar, qualquer tipo de serviço ou profissional. Ele estuda essas áreas dentro da sua formação. E na saúde, mais do que em qualquer outra área, isso é absolutamente fundamental”, complementa Iwersen.
As comissões em gestão da saúde do Conselho Federal da Administração e do Conselho Regional da Administração do Paraná buscam fortalecer a pauta desde a graduação. A atuação nas instituições de ensino superior é para que cursos de Administração incluam a disciplina de gestão em saúde na grade curricular. Já o trabalho junto às empresas do setor busca a inserção do profissional da administração nos quadros de servidores.
Adriana Mesquita
Repórter Rádio ADM
Assessoria de Comunicação CFA