R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de procedimento comum, ajuizada por ZM FOMENTO MERCANTIL LTDA. em face do Conselho Regional de Administração de São Paulo-CRA/SP, objetivando a declaração da inexistência de relação jurídica que lhe imponha o registro no conselho réu, afastando a imposição de multas e demais penalidades.
A sentença julgou procedente o pedido, confirmando a tutela deferida, para declarar a inexistência de relação jurídica entre a parte autora e o Conselho réu, devendo esse abster-se de efetuar cobrança de anuidades futuras. Condenou a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado.
Apelação do Conselho Regional de Administração de São Paulo, pela reforma do decisum. Em suas razões de recurso, sustenta, em síntese, que a empresa de “factoring” presta serviços de fomento mercantil, assessoria mercadológica e financeira, o que vai além da compra de créditos, exercendo, portanto, atividade que se enquadra no campo da ciência da administração, de forma que não se amolda ao precedente do STJ, sujeitando-se, portanto, ao registro no respectivo conselho.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E.Corte.
É o relatório.
V O T O
Cinge-se a controvérsia acerca da necessidade da inscrição perante o Conselho Regional de Administração da empresa de “factoring”.
Com efeito, o critério legal de obrigatoriedade de registro no órgão de fiscalização profissional tem por pressuposto a atividade básica exercida pela empresa ou a natureza dos serviços prestados, conforme se extrai do disposto no artigo 1º da Lei nº 6.839/80,”in verbis”:
“Art. 1º – O registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, serão obrigatórios nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros.”
O artigo 1º da Lei 6.839/1980 dispõe, portanto, sobre a obrigatoriedade de registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros.
Não basta que a empresa exerça, durante a produção, alguma atividade atrelada à profissão tutelada pelo Conselho. Também é irrelevante que a empresa tenha em seu quadro de profissionais um empregado sujeito à inscrição. O registro no conselho profissional é compulsório quando a atividade-fim da empresa é executar atividades que se submetam à fiscalização do Conselho. No caso do Conselho Regional de Administração, haverá obrigatoriedade da inscrição quando a empresa realizar atividades relacionadas com a profissão de administrador. É a finalidade da empresa que determina se é ou não obrigatório o registro no conselho profissional. Se a atividade relacionada com a administração tiver caráter meramente acessório, não é necessária a inscrição no conselho respectivo.
Outrossim, consoante a referida legislação, se a atividade desenvolvida abrange mais de um ramo, excluir-se-á aquele que não representa sua atividade básica ou principal, com a finalidade de coibir a exigência de inscrição simultânea em entidades do mesmo gênero, fiscalizadoras de outras atividades profissionais por ela desempenhada de forma subsidiária.
Ainda, destaco que, com a edição da referida lei, se objetivou inibir a prática, utilizada por alguns conselhos regionais, de, ao fiscalizar a atividade profissional, obrigar empresas que prestavam serviços acessórios relacionados às atividades por eles controladas a efetuarem o respectivo registro e o pagamento de anuidades.
Por sua vez, a Lei nº 4.769/65, diploma responsável por regular o exercício da profissão de Administrador, estabelece, em seu artigo 15, que serão obrigatoriamente registrados nos Conselhos Regionais de Administração as empresas, entidades e escritórios técnicos que explorem, por qualquer forma, as atividades do Técnico de Administração, bem como elenca, em seu artigo 2º, as atividades de competência privativa desses profissionais. Confira-se:
“Art 2º A atividade profissional de Técnico de Administração será exercida, como profissão liberal ou não, VETADO, mediante:
a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;
b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos da administração VETADO, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que esses se desdobrem ou aos quais sejam conexos;
c) VETADO.
(…)
Art. 15. Serão obrigatoriamente registrados nos C.R.T.A. as empresas, entidades e escritórios técnicos que explorem, sob qualquer forma, atividades do Técnico de Administração, enunciadas nos termos desta Lei.”
Por conseguinte, o Decreto 61.934/67, que dispõe sobre a regulamentação do exercício da profissão de Técnico em Administração e dá outras providências, estabelece em seu artigo 3º que:
“Art 3º A atividade profissional do Técnico de Administração, como profissão, liberal ou não, compreende:
a) elaboração de pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens e laudos, em que se exija a aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de organização;
b) pesquisas, estudos, análises, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos de administração geral, como administração e seleção de pessoal, organização, análise métodos e programas de trabalho, orçamento, administração de matéria e financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais bem como outros campos em que estes se desdobrem ou com os quais sejam conexos;
c) o exercício de funções e cargos de Técnicos de Administração do Serviço Público Federal, Estadual, Municipal, autárquico, Sociedades de Economia Mista, empresas estatais, paraestatais e privadas, em que fique expresso e declarado o título do cargo abrangido;
d) o exercício de funções de chefia ou direção intermediaria ou superior assessoramento e consultoria em órgãos, ou seus compartimentos, de Administração Pública ou de entidades privadas, cujas atribuições envolvam principalmente, aplicação de conhecimentos inerentes as técnicas de administração ;
e) o magistério em matérias técnicas do campo da administração e organização”.
O art. 58 da Lei nº 9.430/96, incluiu o inciso XV no art. 36 da Lei n.8.981/95, diz que as empresas de “factoring” são aquelas que exploram “atividades de prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos, administração de contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços”.
Nesse universo, destacam-se, dentre outras, as modalidades denominadas factoring convencional, que consiste nas atividades de compra de crédito (cessão de crédito) e prestação de serviços convencionais (análise de riscos dos títulos e cobrança de créditos da faturizada), e factoring trustee, que engloba as atividades da modalidade convencional, acrescidas da prestação de serviços de administração e assessoria financeira.
Quanto à necessidade da inscrição de empresa de “factoring” perante o Conselho Regional de Administração, o C.STJ já se pronunciou sobre o tema deliberando no seguinte sentido: se a sociedade tiver como objeto social o serviço de orientação mercadológica ou financeira estará sujeita a registro no Conselho de Administração.
Já às empresas que se dedicam à atividade de “factoring” convencional, ou seja, compra de créditos de terceiros, de cunho tipicamente mercantil, não se sujeitam à inscrição no conselho profissional de administração.
Observe-se que a prerrogativa tem caráter restritivo, não se estendendo as todas as modalidades de factoring.
Confira-se:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. FACTORING. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. INSCRIÇÃO. NECESSIDADE. MATÉRIA FÁTICA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE.
1. A Primeira Seção desta Corte Superior de Justiça, quando do julgamento dos EREsp 1.236.002/ES, da relatoria do Min. Napoleão Nunes Maia Filho, fixou o entendimento segundo o qual é desnecessária a inscrição das empresas de factoring nos conselhos regionais de administração nas hipóteses em que as respectivas atividades tenham natureza eminentemente mercantil, isto é, não abarquem gestões estratégicas, técnicas e programas de execução cujo objetivo seja o desenvolvimento de empresas.
2. Hipótese em que o Tribunal de origem, com arrimo no contexto fático-probatório, verificou que a agravante tem por objeto operacional principal o fomento comercial mediante a aquisição de direitos creditórios representativos de créditos originários de operações de compra e venda mercantil ou da prestação de serviços realizadas nos segmentos industrial, comercial, serviços, agronegócio e imobiliário ou de locação de bens móveis, imóveis e serviços, funções típicas realizadas por um administrador, conclusão insuscetível de revisão na via do recurso especial, à vista da vedação prevista na redação da Súmula 7 do STJ.
3. Agravo interno desprovido.
(AgInt no AREsp n. 2.031.256/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 15/9/2022.) (destaquei)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. EMPRESA DE FACTORING . ATIVIDADE DESENVOLVIDA PELA EMPRESA DE NATUREZA EMINENTEMENTE MERCANTIL. REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. INEXIGIBILIDADE. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA ACOLHIDOS, PARA QUE PREVALEÇA A TESE ESPOSADA NO ACÓRDÃO PARADIGMA.
1. In casu, observa-se a ocorrência de divergência de teses jurídicas aplicadas à questão atinente à obrigatoriedade (ou não) das empresas que desenvolvem a atividade de factoring em se submeterem ao registro no Conselho Regional de Administração; o dissídio está cabalmente comprovado, haja vista a solução apresentada pelo acórdão embargado divergir frontalmente daquela apresentada pelo acórdão paradigma.
2. A fiscalização por Conselhos Profissionais almeja à regularidade técnica e ética do profissional, mediante a aferição das condições e habilitações necessárias para o desenvolvimento adequado de atividades qualificadas como de interesse público, determinando-se, assim, a compulsoriedade da inscrição junto ao respectivo órgão fiscalizador, para o legítimo exercício profissional.
3. Ademais, a Lei 6.839/80, ao regulamentar a matéria, dispôs em seu art. 1o. que a inscrição deve levar em consideração, ainda, a atividade básica ou em relação àquela pela qual as empresas e os profissionais prestem serviços a terceiros.
4. O Tribunal de origem, para declarar a inexigibilidade de inscrição da empresa no CRA/ES, apreciou o Contrato Social da empresa, elucidando, dessa maneira, que a atividade por ela desenvolvida, no caso concreto, é a factoring convencional, ou seja, a cessão, pelo comerciante ou industrial ao factor, de créditos decorrentes de seus negócios, representados em títulos.
5. A atividade principal da empresa recorrente, portanto, consiste em uma operação de natureza eminentemente mercantil, prescindindo, dest’arte, de oferta, às empresas-clientes, de conhecimentos inerentes às técnicas de administração, nem de administração mercadológica ou financeira.
6. No caso em comento, não há que se comparar a oferta de serviço de gerência financeira e mercadológica – que envolve gestões estratégicas, técnicas e programas de execução voltados a um objetivo e ao desenvolvimento da empresa – com a aquisição de um crédito a prazo – que, diga-se de passagem, via de regra, sequer responsabiliza a empresa-cliente -solidária ou subsidiariamente – pela solvabilidade dos efetivos devedores dos créditos vendidos.
7. Por outro lado, assinale-se que, neste caso, a atividade de factoring exercida pela sociedade empresarial recorrente não se submete a regime de concessão, permissão ou autorização do Poder Público, mas do exercício do direito de empreender (liberdade de empresa), assegurado pela Constituição Federal, e típico do sistema capitalista moderno, ancorado no mercado desregulado.
8. Embargos de Divergência conhecidos e acolhidos, para que prevaleça a tese esposada no acórdão paradigma e, consequentemente, para restabelecer o acórdão do Tribunal de origem, declarando-se a inexigibilidade de inscrição da empresa embargante no CRA/ES”.
(EREsp 1236002/ES, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/04/2014, DJe 25/11/2014). (destaquei)
ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMPRESA QUE SE DEDICA À ATIVIDADE DE FACTORING. REGISTRO NO RESPECTIVO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. DESNECESSIDADE.
1. A Primeira Seção do STJ, no julgamento do EREsp 1.236.002/ES (Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 25/11/2014), decidiu ser inexigível a inscrição da empresa que se dedica ao factoring convencional no respectivo Conselho de Administração, tendo em vista que tal atividade “consiste em uma operação de natureza eminentemente mercantil, prescindindo, destarte, de oferta, às empresas-clientes, de conhecimentos inerentes às técnicas de administração, nem de administração mercadológica ou financeira”. 2. Agravo interno não provido.
(AgInt no REsp 1613546/RJ – PRIMEIRA TURMA – MIN. SÉRGIO KUKINA – DJE DATA:26/02/2019)”
“ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. EMPRESA DE FACTORING. DESNECESSIDADE DE REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. ATIVIDADE BÁSICA. SÚMULA 7/STJ. PRECEDENTES. COMPRA DE ATIVOS OU DIREITOS CREDITÓRIOS DECORRENTES DE VENDAS MERCANTIS A PRAZO.
A obrigatoriedade da inscrição das empresas em determinado Conselho profissional, é ditada pela “atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros” independentemente do profissional que devam contratar para a realização da tarefa. Precedentes:AgRg no REsp 1020819/SC, DJ 09.05.2008;AgRg no REsp 928.810/ES, DJ 19.11.2007;REsp 867.945/RS, DJ 22.03.2007. 2. O artigo 1º da Lei nº 6.839/80, dispõe que o registro de tais empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados serão obrigatórios em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros, e não em relação à atividades secundárias. 3. As empresas que desempenham atividades relacionadas ao factoring estão dispensadas da obrigatoriedade de registro no Conselho Regional de Administração, porquanto comercializam títulos de crédito. 4. As atividades desempenhadas pelas empresas de factorings na modalidade convencional, que envolve funções de compra de crédito (cessão de crédito) e prestação de serviços convencionais (análise de riscos dos títulos e cobrança de créditos da faturizada) não estão no alcance da fiscalização profissional do Conselho Federal de Administração – CRA, porquanto sua atividade-fim não se enquadra nas hipóteses elencadas como de natureza administrativa. 5. O campo de atuação do factoring é a compra de ativos ou direitos creditórios decorrentes de vendas mercantis a prazo. Negociam-se direitos gerados pelas vendas mercantis a prazo, mas sem o recurso do desconto dos títulos de crédito. Faz-se a compra mediante um preço, por meio do endosso como instrumento do ato translativo da propriedade dos direitos creditórios. (Arnaldo Rizzardo, In Factoring, 3ª edição, RT, páginas 82/83) 6. É cediço que somente na modalidade de factoring conhecida por trustee o faturizador prestará serviços diferenciados, como co-gestão, consultoria etc. Podemos afirmar – sem nenhuma dúvida – que é raro uma operação de factoring que envolva a modalidade trustee. A mais usualmente praticada é a modalidade convencional. E na modalidade convencional de factoring, os serviços prestados, quando o são, não envolvem administração, consultoria ou co-gestão, pois tais serviços são próprios somente na modalidade trustee.” (Antonio Carlos Donini, in Inexigibilidade do Registro da Empresa de Factoring junto ao Conselho Regional de Administração, Revista dos Tribunais, ano 92 – volume 810 – abril de 2003 – páginas 84/85). 7. A única modalidade que, em tese, pode-se admitir a prática de atos ditos “administrativos” de factoring é na modalidade trustee, por envolver prestação de serviços diferenciados, a saber, co-gestão e consultoria, situação cuja análise resta obstada nesta instância à luz do verbete sumular nº 7/STJ, por impor o revolvimento da matéria fático-probatória. 8. In casu, o objeto da sociedade é prestar serviços de gestão comercial, executados em caráter cumulativo e contínuo, adquirir direitos creditório decorrentes de vendas mercantis a prazo; efetuar cobranças por conta própria e de terceiros, ceder seus direitos a terceiros, e efetuar negócios de “Factoring” no mercado interno e internacional de importação e exportação. 9. O Tribunal de origem assentou que: “Como se vê, a empresa não tem como atividade principal nenhuma daquelas constantes na Lei nº 4.769/65 que a obrigariam ao registro no Conselho de Administração, ” assertiva que impõe a não sujeição da recorrida à inscrição no Conselho de Classe, ora recorrente, bem como a insindicabilidade pelo E. STJ (Súmula 07). 10. Recurso especial parcialmente conhecido, e nesta parte desprovido.
(REsp 932978 / SC – PRIMEIRA TURMA – MIN. LUIZ FUX – DJE DATA: 01/12/2008)
No mesmo sentido os julgado desta E.Corte:
CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO – EMPRESA DE FACTORING – NÃO SUJEIÇÃO.
1. A apelante exerce atividade de “factoring” e não agrega prestações de consultoria financeira.
2. A exigência de sujeição ao Conselho Regional de Administração é irregular.
3. Apelação desprovida.
(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv – APELAÇÃO CÍVEL – 5002510-21.2019.4.03.6108, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 28/05/2021, DJEN DATA: 15/06/2021)
ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. EMPRESA CUJA ATIVIDADE BÁSICA É O FACTORING CONVENCIONAL (FOMENTO MERCANTIL). SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL Nº 1.236.002/ES. REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO (CRA/SP) – DESNECESSIDADE.
1. A averiguação acerca da necessidade de registro junto ao CRA/SP deve ter por supedâneo a atividade básica exercida pelo profissional liberal ou empresa, assim entendida como aquela de natureza principal (artigo 1º da Lei nº 6.839/1980).
2. A questão atinente à definição da necessidade do registro das empresas de fomento mercantil (factoring) perante os Conselhos Regionais de Administração depende em especial da delimitação do âmbito de suas atividades: se atuam como factorings convencionais, o registro não se faz necessário, pois se trata de atividade básica cuja natureza é estritamente mercantil. Caso, de modo diverso, as atividades preponderantemente desenvolvidas por tais empresas extrapolem esse âmbito de atuação, de forma a abranger atos típicos de gestão/administração empresarial, restará evidenciado o exercício de atividade privativa do Administrador e, por conseguinte, será imprescindível o registro no Conselho em questão (exegese do EREsp nº 1.236.002/ES).
3. De acordo com a Quarta Alteração Contratual registrada na Jucesp em 15/07/2015, a empresa autora “tem por objeto operacional principal o fomento comercial mediante a aquisição de direitos creditórios representativos de créditos originários de operações de compra e venda mercantil ou da prestação de serviços realizadas nos segmentos: industrial, comercial, serviços, agronegócio e imobiliário ou de locação de bens móveis, imóveis e serviços”.
4. A atividade básica da empresa, assim entendida como aquela de natureza principal/preponderante, é o “factoring convencional”, vez que direcionada ao fomento comercial, de modo que possui natureza mercantil, sem envolver eventual oferta aos clientes de conhecimentos técnicos, mediante atos de administração financeira, mercadológica ou de produção. Não se amolda, portanto, às atribuições típicas do Administrador, discriminadas no artigo 2º da Lei nº 4.769/1965.
5. Por se tratar de atividade principal que não é de exclusiva execução por Administradores, não se faz necessário o registro da empresa autora no CRA/SP. Precedentes (STJ e TRF3).
6. Correto o entendimento jurisprudencial no sentido de ser cabível o cancelamento do registro da parte autora no CRA/SP. Inexigíveis, assim, eventuais débitos que tenham origem posterior à apresentação do pedido de exclusão/cancelamento do registro, recebido pelo órgão profissional em 09/01/2018.
7. Com relação aos honorários advocatícios, considerando que o valor atribuído à causa é muito baixo, aplicável à hipótese dos autos o disposto no § 8º do artigo 85 do Código de Processo Civil. Apreciação equitativa. Majoração da verba honorária para o valor de R$ 600,00 (seiscentos reais).
8. Acréscimo do percentual de 5% (cinco por cento) a esse importe (artigo 85, § 11, do CPC).
9. Apelação do CRA/SP a que se nega provimento.
10. Apelação da parte autora provida.
(AC 50107627120184036100, DESEMBARGADORA FEDERAL CECÍLIA MARCONDES, TRF3 – TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/02/2020). (destaquei)
Nesse caso, o contrato social (ID 306696313, fl. 02) da parte autora indica como objeto social:
“Desenvolver negócios de fomento, atividade mercantil mista atípica que consiste:
a) na prestação de serviços em caráter contínuo, de acompanhamento do processo produtivo e mercadológico das empresas clientes ou de acompanhamento de suas contas a receber e a pagar ou de seleção e avaliação de riscos de seus sacados devedores,
b) e, conjugadamente, na compra, à vista, total ou parcial de créditos das empresas clientes resultantes de suas vendas mercantis e/ou de prestação de serviços por elas realizadas à prazo,
c) na realização de negócios de FACTORING no comércio internacional de importação e exportação”
In casu, analisando minuciosamente o contrato social da apelada, observo que as atividades ali propostas extrapolam aquelas previstas na modalidade “factoring convencional”, vez que, dentre outras, englobam: o acompanhamento do processo produtivo e mercadológico das empresas clientes e seleção e avaliação de riscos de seus sacados devedores (assessoria mercadológica e financeira, que se encontra inclusa dentre as atividades profissionais privativas do Técnico de Administração – art. 2º, alínea “b”, da Lei nº 4769/65), e operações de factoring no comércio internacional de importação e exportação (factoring internacional).
Portanto, ao contrário do que alega a autora, verifica-se que não se trata, exclusivamente, de factoring convencional, já que juntamente com a compra de créditos, há a prestação dos serviços de administração, acima citados, o que, por sua vez, mantém íntegra a obrigatoriedade de registro/inscrição da apelada perante o Conselho Regional de Administração de São Paulo.
Destarte, de rigor a reforma da r. sentença, para declarar a manutenção da exigibilidade de inscrição/registro da apelada junto ao Conselho Regional de Administração de São Paulo – CRA/SP e, por sua vez, reconhecer a higidez da cobrança dos débitos devidos, tudo, nos termos retro mencionados.
Por fim, anoto que eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos.
Ante a procedência do pedido, em consequência, inverto os ônus de sucumbência fixados na sentença recorrida.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação, nos termos da fundamentação.
É o voto.
DESEMBARGADOR FEDERAL
E M E N T A
ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. EMPRESA QUE SE DEDICA À ATIVIDADE DE FACTORING. REGISTRO JUNTO À AUTARQUIA. NECESSIDADE. APELAÇÃO PROVIDA.
– O critério legal de obrigatoriedade de registro de empresas nos Conselhos Profissionais, previsto na Lei n. 6.839/80, bem como a contratação de profissional legalmente habilitado em área específica, vincula-se à atividade básica da empresa ou pela natureza dos serviços por ela prestados.
– O C.STJ já se pronunciou sobre o tema e entende que a empresa de “factoring”, fornecedora de orientação mercadológica ou financeira, está sujeita a registro no Conselho de Administração, mas as empresas que se dedicam exclusivamente à atividade de “factoring” convencional, ou seja, compra de créditos de terceiros, de cunho tipicamente mercantil, não se sujeitam à inscrição no conselho profissional de administração. Precedentes.
– Da análise minuciosa do contrato social da apelada, verifica-se que as atividades ali propostas extrapolam aquelas previstas na modalidade “factoring convencional”, vez que, dentre outras, englobam: o acompanhamento do processo produtivo e mercadológico das empresas clientes (assessoria mercadológica e financeira, que se encontra inclusa dentre as atividades profissionais privativas do Técnico de Administração – art. 2º, alínea “b”, da Lei nº 4769/65), e operações de factoring no comércio internacional de importação e exportação (factoring internacional).
– Não se trata a hipótese dos autos, exclusivamente, de factoring convencional, já que juntamente com a compra de créditos, há a prestação de serviços de administração, o que, por sua vez, mantém íntegra a obrigatoriedade de registro/inscrição da apelada perante o Conselho Regional de Administração de São Paulo.
– Inversão dos ônus sucumbenciais fixados na sentença.
– Apelação provida.
[…]
(TRF3- PELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA Nº 5023910-47.2021.4.03.6100. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO. Julgado em: 31/01/2025)